Sophia Parnok (Sonya Yakovlevna Parnokh) foi uma poetisa de origem judaica nascida na cidade de Taganrog, em 1885, e é considerada uma das primeiras mulheres assumidamente lésbicas da literatura russa. Muitos se referem a ela como “A Safo da Rússia” – um título que ela teria adorado, já que era vocal sobre a admiração que nutria pela poeta grega, cuja figura você pode conhecer neste artigo da nossa coluna História Queer.

Embora tenha começado a discutir amplamente a sua sexualidade nas obras apenas aos 16 anos, há evidências que a família de Sophia sabia sobre sua orientação desde antes – o que foi motivo de conflitos entre ela e o pai. Em certo momento, a então jovem poeta escreveu: “Pelos olhos do meu pai, sou apenas um deslize selvagem de uma garota e nada mais. Minha forma de pensar e meus gostos ofendem seus valores patriarcais e ele me condescende.” (a palavra russa “gostos” é comumente utilizada para descrever desejos que não são heterossexuais e, nesta citação, aparece com este significado). 

Por conta da complicada convivência familiar, Sophia Parnok tentou se mudar de casa várias vezes, mas sempre teve de retornar quando os problemas financeiros aumentaram. Aos 13 anos, ela conseguiu se casar com Vladimir Volkenstein, um amigo poeta, por conveniência – com ele, foi franca sobre suas intenções desde o princípio: o casamento era uma forma de combinar a renda com a almejada liberdade. 

Ao lado do marido, chegou em São Petersburgo, onde conseguiu mergulhar completamente na cena artística local. Finalmente capaz de encontrar outros como ela na nova cidade, a poetisa começou a construir amizades e relacionamentos amorosos na mesma medida. 

Ao se divorciar dois anos mais tarde, Sophia decidiu buscar a sorte grande em Moscou e a se relacionar exclusivamente com mulheres. Já no começo da Primeira Guerra Mundial, ela viveu seu relacionamento mais famoso com uma poetisa chamada Marina Tsvetaeva. A relação entre as duas foi passional e veio a influenciar fortemente os trabalhos de ambas. Pouco antes do término, a primeira coleção de poesias de Sophia foi lançada, contendo o que foi considerado por Diana Burgin, pesquisadora do seu trabalho, como “o primeiro desejo lésbico não decadente a aparecer num livro de poesia russa”.

Marina Tsvetaeva, poetisa com quem Sophia manteve um de seus maiores e principais romances (foto: Reprodução)
Marina Tsvetaeva, poetisa com quem Sophia manteve um de seus maiores e principais romances (foto: Reprodução)

Após o ávido romance, Sophia se mudou para a Crimeia e se envolveu com uma nova amante, passando a escrever não apenas poesia, mas também músicas para a ópera. Logo depois, ela retornou à capital russa, onde conheceu a matemática Olga Tsuberbiller, com quem passaria o resto de sua vida, na Universidade de Moscou, além de publicar mais dois livros de poesia, considerados como algumas de suas melhores obras. 

Sophia Parnok (esq.) e Olga Tsuberbiller (dir.) fotografa na década de 1920 (Foto: Reprodução)
Sophia Parnok (esq.) e Olga Tsuberbiller (dir.) fotografa na década de 1920 (Foto: Reprodução)

O crescimento de sua carreira foi interrompido em 1928, quando a censura da União Soviética impediu novas publicações de Sophia, principalmente com o teor lésbico ao qual a autora já havia se acostumado. Mesmo que tenha continuado a escrever, os únicos livros lançados com seu nome neste período foram traduções, enquanto seu trabalho pessoal continuou mantido em uma “gaveta secreta” sendo publicado apenas em 1930. 

“Cegamente encarando olhos
de Maria e da Criança Salvadora.
Cheiro de incenso, cera, óleo.
Sons de prantos suaves preenchendo a igreja.
Derretendo velas seguradas pelos jovens, dóceis meninas.
De punhos rígidos, frios, pele áspera.
Ah, roube-me de minha morte
Você, cujos braços bronzeados e refrescantes,
Você, aquela que passou por mim, me excitando!
Não há no seu nome desesperado
um vento jogado por todas as encostas
Marina, nomeada em homenagem ao mar!”

Poema de Sophia, escrito em 1915, para sua então amante Marina Tsvetaeva

Em 1933, tudo acabou quando Sophia morreu de ataque cardíaco. Seu falecimento, infelizmente, não foi inesperado já que ela era portadora de uma doença autoimune. Ainda assim, ela teve sorte suficiente de estar cercada por três das mulheres que a amaram para lhe dizer um último adeus. Seu corpo foi levado para Moscou por uma procissão de pessoas que vieram de partes diferentes da Rússia, incluindo amigos, amantes e fãs.

Sophia sofreu muito em sua vida: censura, doença crônica, pobreza, desilusões amorosas e chegou até a passar por um período morando na rua, mas nunca pode-se dizer que não foi amada. Sua trajetória foi rodeada por pessoas que amava e que a amavam de volta, inspirando fãs, até hoje, com sua arte sensível e impactante.


Este texto foi adaptado do original de Laura Darling e faz parte do projeto Making Queer History, cuja existência só é possível graças a doações. Se tiver interesse, você pode fazer uma doação única no Paypal ou tornar-se um Patrono.