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Vitor diCastro sobre signos, seguidores e “ser quem você é”

Vitor diCastro: "Precisei desconstruir tudo que construíram em cima de mim" (Foto: Breno da Matta | Divulgação)

Nascido em Caçapava, no Vale da Paraíba, o youtuber, influenciador, humorista e guru astrológico Vitor diCastro nunca sentiu que pertencia ao clima conservador da cidade de 95 mil habitantes no interior de São Paulo. E ele estava certo.

Aos 31 anos, Vitor já alcança 80 vezes a população de Caçapava com seus seguidores nas redes sociais, onde aparece em vídeos e fotos com as unhas pintadas, brincos de argola e o jeito afeminado, às vezes ao lado do marido, o jornalista Vinícius Cordeiro. Com piadas didáticas e bom humor, ele comenta mil e uma particularidades sobre signos no seu canal Deboche Astral, mas também não deixa de militar e marcar seu posicionamento sobre pautas LGBTI+.

“Eu pareço uma pessoa sem preconceitos, mas nem sempre foi assim”, conta Vitor diCastro, durante uma videochamada com a Híbrida. “Levei um tempo até descobrir isso sobre sexualidade, gênero e tudo o que eu tinha aprendido. Em cinco anos de São Paulo, tive que desaprender tudo e que a vida não era daquela maneira [que eu achava]. É muito mais plural.”

Vitor chegou na maior metrópole do País há 14 anos, disposto a sair de um lugar onde “não via ninguém igual por perto”, desde que se entendeu como uma criança viada. Se em Caçapava ele tentava disfarçar a orientação sexual por “não caber” naquele meio, ao chegar em São Paulo ele se deparou com uma cidade plural, pelo menos à primeira vista, onde podia crescer e se tornar a bicha que é.

“Foi um processo doloroso até entender que ‘tudo bem ser quem você é’. Mas era pra ser um negócio mais simples, né Brasil?!”, lembra sobre o período, sem perder o bom humor. Com o tempo, ele conta, as aulas de teatro, um namoro saudável, e a convivência com outras pessoas LGBTI+ dentro e fora da internet foram ajudando até que ele desabrochasse. “Hoje, eu não faço esforço pra ser quem eu sou. Minha essência é a mesma, e conseguir colocar isso pra fora é o que faz as pessoas se conectarem, poque nos conectamos com pessoas reais. Não é alguém que eu interpreto nas redes, é alguém que eu sou na vida.”

“Precisei desconstruir tudo que construíram em cima de mim. O que a galera me xingava na escola não era xingamento, era eu mesmo” 

Com quatro irmãos, dois homens e duas mulheres, Vitor cresceu literalmente no meio de uma família conservadora que, até o falecimento do seu pai em 2014, ainda reproduzia o pensamento interiorano e homofóbico, o que só se agravou ainda mais quando ele foi “tirado do armário”. Hoje, ele comemora, a relação com a família já é outra. “Não devia ter aceitado esse tratamento nem do meu pai, mas aceitei. Como ele não pôde participar da desconstrução, quem ficou que faça sua parte. Mas fiz isso me impondo. Não estou fazendo nada de errado, então não aceitei mais que ninguém me destratasse.”

Vitor diCastro e a homofobia: ‘Pode ser gay lá fora’

Como um dos principais influenciadores LGBTI+ da seara digital, Vitor começou trabalhando como editor de vídeos no Quebrando O Tabu, onde aperfeiçoou o conhecimento técnico sobre produção de conteúdo para a internet que mais tarde daria vazão às suas próprias ideias e histórias. Hoje, ele é convidado para publis e lives, como na última edição online da Parada do Orgulho LGBTQIA+ de São Paulo, onde foi um dos apresentadores.

“A minha primeira Parada foi no dia que eu vim pra São Paulo fazer o vestibular. Quando saí da prova e descobri que ela tava rolando, uns amigos que moravam aqui me chamaram. Nunca vi tanto gay na minha vida!”, lembra. “Eu já tinha ideia de que a Parada era uma ‘putaria desgraçada’ (risos), mas depois fui perceber que a festa do domingo é só um ponto do evento, que começa desde a quinta-feira por aqui, com muita exposição, palestra, bate-papo, bar com bandeira na porta, teatro e muita coisa acontecendo. Aí entendi a importância que ela tem.”

Vitor diCastro: "Hoje, eu não faço esforço pra ser quem eu sou" (Foto: Breno da Matta | Divulgação)
Vitor diCastro: “Hoje, eu não faço esforço pra ser quem eu sou” (Foto: Breno da Matta | Divulgação)

Vitor diCastro compara o lado festivo e economicamente lucrativo das Paradas com o “expurgo” do carnaval brasileiro, mas frisa aos desavisados que até mesmo no domingo é possível encontrar pessoas com bandeira, família e “outro clima”. E, enquanto outras causas e pautas sociais conseguem apoio e patrocínio ao longo do ano, festejar o Mês do Orgulho em junho, quando as empresas finalmente viram os olhos e bolsos para a comunidade LGBTI+, já é um avanço.

“Junho é o Mês da Diversidade, então esse é o momento que é hype, bonito, que as empresas vão mudar a logo, e eu acho isso tudo lindo e maravilhoso por termos um mês inteiro. E percebo que, a cada ano, tem mais gente interessada em surfar nessa onda. O lado positivo é que as empresas não são obrigadas a fazer isso, então é um sinal que elas entendam que vão lucrar mais porque a sociedade já aceita LGBTIs mais do que aceitava antes”, observa.

Apesar do avanço, Vitor diCastro reconhece, ainda estamos “muito longe” do patamar necessário. “Há cinco anos, um posicionamento podia fazer que a empresa sofresse boicote. Hoje não, tem.comercial com beijo lésbico às 9h30 da manhã é ótimo. Mas [esse movimento] tá no começo, engatinhando e o lado negativo é que para em junho. Fora esse hype, as marcas ainda caem no mesmo lugar heteronormativo de sempre, onde dificlmente você vê travestis sendo contratadas. Sempre que sou chamado pra falar numa empresa, falo isso: ‘Amei o convite, mas e mês que vem?’.”

Vitor diCastro acredita que o humor pode ser usado para quebrar barreiras de preconceito e tornar o deboche numa importante ferramenta educativa na quebra de noções arcaicas sobre a comunidade LGBTI+. Ao mesmo tempo, admite que mesmo ele perde a paciência com algumas notícias e comentários, como os de quem tenta invalidar a legitimidade de casamentos homoafetivos.

“Qundo a coisa é um gatilho pra mim, eu não consigo. Se me lembrar de experiências traumáticas, talvez eu consiga fazer mais um comentário ácido”, explica, afirmando que nesses momentos ele consegue até ser mais agressivo, como quando um participante do Big Brother Brasil questionou “como levar um menino de saia para as boates de Goiânia”. “Pra quem já morou no interior, isso atinge um lugar muito específico”, conta. “Daí alguém fala ‘Ah, eu acho que você deveria ser menos agressivo’. Ah, é? E eu acho que você deveria tomar no meio do seu cu.”

Como em junho também comemoramos o Dia dos Namorados, Vitor, expert de signos como é, dá uma dica para quem vai curtir o feriado solamente este ano, a pedido da Híbrida. “Solteiros, uni-vos. Se a data te incomoda, é bom se unir a outras pessoas solteiras, mesmo que de forma virtual. Não tem que sofrer! Vai aproveitar, porque ser solteiro tem muitas vantagens”, ri.

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