O Big Brother Brasil 21 se encerrou na noite desta terça (4), com a vitória do prêmio de R$ 1,5 milhão à inquestionável favorita Juliette Freire. Edição histórica para a Rede Globo, o programa bateu recordes ao trazer o maior número de participantes negros no elenco, picos de audiência há muito tempo não vistos para a atração e discussões importantes e polêmicas, levadas para o horário nobre e posteriormente dissecadas à exaustão na internet — em sua página na Wikipédia, por exemplo, a quantidade de controvérsias gerou até memes, dada a extensão de assuntos explorados.

Seguindo escalação semelhante ao que foi visto na temporada anterior, o “Big dos Bigs” trouxe participantes anônimos (seção pipoca) e famosos (camarote) para o jogo. Com vilões, heróis e plantas, uma trajetória se destacou dentro e fora da casa mais vigiada do País: a do economista pernambucano Gilberto Nogueira.

Considerado por muitos como o protagonista da edição, Gil do Vigor, como ficou carinhosamente conhecido, comoveu o público com seu carisma inegável e sua entrega ao jogo. Ao longo da temporada, liderou barracos memoráveis, chorou ao som de Watermelon Sugar (“hiiigh”), foi o responsável pela melhor festa da temporada, encenou performances que orgulhariam Britney Spears e ainda introduziu um léxico próprio ao vocabulário do espectador com palavras e expressões como “basculho”, “cachorrada” e “o Brasil tá lascado”.

Prova de seu inegável sucesso é que, aqui fora, o participante conseguiu unir grupos distintos na tentativa de torná-lo vencedor. De Pabllo Vittar até páginas do Twitter focadas em futebol, mutirões foram formados online para tentar mantê-lo na competição a cada nova formação de paredão disputada por ele.

Mais além, sua presença magnética nas atrações matutinas da Globo, no dia seguinte à sua eliminação, gerou picos de audiência para o Mais Você e para o Plantão BBB; enquanto isso, sua ausência na “casa mais assistida do Brasil” foi sentida quando o episódio antecedente à final do BBB teve o segundo pior resultado em uma segunda-feira para esta edição do reality.

Nascido no município de Jabotão dos Guararapes (PE), Gilberto tem uma história de vida que seria digna de filme, aos moldes de “À procura da felicidade” — longa que, segundo ele, serviu de inspiração para cursar Economia e enfrentar os obstáculos da pobreza com a qual convivia na infância.

Abandonado pelo pai aos 4 anos por não ser considerado “tão preto”, o pernambucano foi criado por Jacira Santana, a “mainha” ou “Dona Jacira”, que desde cedo ensinou aos filhos a importância do estudo para evitar uma vida difícil. Aos 10, foi batizado como mórmon e, nove anos depois, trancou a faculdade para atuar como missionário em São Paulo. Gilberto trabalhou também como vendedor de seguros e foi cantor de coral erudito.

Antes de entrar para o reality, se afastou da religião ao declarar sua homossexualidade. Já confinado, afirmou que sofreu bullying por ser gay e evangélico e que gostaria de servir como exemplo para outros como ele, que acreditam em Deus, mas não se sentem apoiados nas igrejas.

“Tem pessoas que vivem dentro dessas igrejas sofrendo. Tem um lugar que tem uma taxa de suicídio muito alta entre os jovens gays da igreja porque é muito complicado. Eu quero, pelo amor de Deus, que chegue até eles o Big Brother, que eles vejam que eu ganhei um carro porque fiz uma oração no meio do intervalo e Deus me mostrou o número e eu acertei. Para eles entenderem que Deus continua falando comigo, mesmo eu sendo bicha ou não. Eu me revelando ou não, eu tomando cachaça ou não. Deus não deixa de falar comigo de jeito nenhum”, revelou em conversa com o brother Caio Afiune.

Mais do que servir de exemplo para jovens LGBTIs que convivem com o dilema da autoaceitação no meio religioso, Gilberto também fez com que a Globo chegasse ao século XXI. Embora não tenha sido o primeiro participante gay a concorrer pelo prêmio principal (como se esquecer de Jean Wyllys, vencedor do BBB 5?! Ou dos closes de Serginho Orgastic, na 10ª edição?!), ele protagonizou o primeiro beijo entre dois homens na história do Big Brother Brasil.

Ao som de Ludmilla, o pernambucano beijou Lucas Penteado, que se assumiu bissexual em conversa com Gil. A cena foi exibida tanto no episódio oficial do programa quanto na programação diurna da emissora. Semanas depois, pulou nu na piscina com Fiuk, após darem um selinho em comemoração por terem escapado da eliminação, em uma imagem que viralizou incansavelmente nas redes.

Hoje, ele é o brother mais seguido da história do BBB no Instagram. Na internet, personalidades como Xuxa, Dani Calabresa e até mesmo Boninho, diretor do programa, lamentaram sua saída do reality. Fora da jornada do BBB, ele foi aprovado com bolsa em dois programas de doutorado nos Estados Unidos. Para Ana Maria Braga, revelou que pretende optar pela Universidade da Califórnia.

Mesmo que não tenha vencido o prêmio principal e tenha ficado de fora da final, Gilberto Nogueira conquistou o País. Sua espontaneidade, sem medo de demonstrar seus desejos; suas paranoias, com o medo de ser aceito aqui fora e as diversas idas e vindas no jogo, sem trair o que genuinamente é, tornaram-no o participante mais humano da competição.

No discurso de eliminação, o apresentador Tiago Leifert não negou a importância de Gil, se referindo a ele como “um dos maiores personagens da história do programa” e “um exemplo para todo mundo que um dia venha se inscrever no Big Brother Brasil”. Mais que exemplo para futuros ingressos na atração, seu legado como um homem autêntico, divertido e complexo, com a bagagem de ex-mórmon LGBTI+, deverá reverberar para muitos brasileiros que se encantaram e se identificaram com sua trajetória inspiradora.