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Reconhecimento de histórias LGBTQIA+ cresce no Oscar, mas segue longe do ideal

Reconhecimento de histórias LGBTQIA+ cresce no Oscar, mas continua longe do ideal

Reconhecimento de histórias LGBTQIA+ cresce no Oscar, mas continua longe do ideal

Há seis anos, Moonlight: Sob a Luz do Luar levava a desejada estatueta de Melhor Filme no 89º Oscar. Desbancando o favoritismo do musical La La Land: Cantando Estações numa gafe inesquecível da premiação, o êxito do filme de Berry Jenkins sinalizou uma guinada ao futuro para a Academia ao conceder o prêmio principal para uma história comovente sobre a jornada de um jovem garoto preto e seu entendimento como sujeito LGBTQIA+. O precedente ali aberto ainda reverbera e aparece já na lista de histórias, talentos e personagens indicados à premiação do próximo domingo (12).

Ainda que diversos percalços tenham ocorrido de lá para cá – como a questionável vitória de Green Book em 2019 e as constantes esnobadas a mulheres diretoras e pessoas não-brancas nas categorias de atuação -, a mais tradicional festa do cinema tem contado com mais narrativas sobre personagens queer em suas indicações. Ao menos, é o que a safra de filmes lançados em 2022 demonstra.

Na categoria de Melhor Filme, dois dos dez indicados possuem personagens LGBTQIA+ em papéis de destaque: TÁR, de Todd Field, que também concorre nas categorias de Melhores Diretor, Atriz, Roteiro Original, Fotografia e Edição; e o grande favorito aos principais prêmios da noite, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, de Daniel Kwan e Daniel Scheinert, com 11 indicações no total.

Em ambos, não há suspeitas sobre a orientação sexual da protagonista Lydia Tár (interpretada com maestria por Cate Blanchett) e da filha Joy Wang (a carismática Stephanie Hsu). Inclusive, é possível afirmar que a sexualidade das personagens desempenha função importante na condução das narrativas de cada um dos filmes.

Em TÁR, o sistemático abuso de poder perpetuado pela maestra-título em torno de alunas mais jovens é o que assombra seu passado e presente, demonstrando que uma obra guiada por uma personagem com conduta ética questionável pode ser tão boa – se não melhor – que narrativas voltadas para uma representatividade LGBTQIA+ sempre positiva e, às vezes, vazia. Grosso modo, uma versão lésbica da necessidade de “histórias sobre gays trambiqueiras”.

Já para Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, o embate entre as diferenças geracionais e o desejo de assumir um relacionamento homoafetivo para os familiares serve de pontapé no desenrolar das desavenças entre filha e mãe (Michelle Yeoh) que, ao longo de todos os multiversos, buscam se aceitar e se compreender melhor.

A pluralidade das histórias, conflitos e personagens LGBTQIA+ que ganharam espaço no Oscar deste ano não para por aí. O polêmico A Baleia, de Darren Aronofosky, concorre nas categorias de Melhor Ator (Brendan Fraser), Atriz Coadjuvante (Hong Chau) e Maquiagem e Penteado ao contar a história de um professor queer que tenta se reconectar com a filha (interpretada por Sadie Sink). O filme também representa o retorno de Fraser, que esteve afastado do cinema após sofrer assédio sexual por um dos presidentes da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood em 2003 – a mesma responsável por conceder os prêmios do Globo de Ouro.

Close, de Lukas Dhont, que passou por aqui no último Festival do Rio, é o representante da Bélgica na competição de Melhor Filme Internacional e traz a tempestuosa amizade entre os jovens Léo (Eden Dambrine) e Rémi (Gustav de Waele). Vencedor do Grand Prix no Festival de Cannes de 2022, ele foi elogiado mundo afora pela maneira como aborda a homofobia e a descoberta do primeiro amor durante a pré-adolescência.

Há ainda o curta-metragem Night Ride, de Eirik Tveiten; o documentário All the Beauty and the Bloodshed, de Laura Poitras, sobre a carreira da fotógrafa Nan Goldin, conhecida por registrar a comunidade LGBTQIA+ nova-iorquina durante a década de 1980; e Glass Onion: Um Mistério Knives Out, de Rian Johnson, que se aprofunda um pouco mais na identidade queer do detetive Benoit Blanc, interpretado por Daniel Craig, além de trazer Janelle Monaé como protagonista.

No entanto, mesmo que tramas do tipo tenham ganhado espaço nos cinemas e, consequentemente, em premiações tradicionais, verdadeiras figuras não-heterossexuais continuam à margem dos holofotes. Neste ano, as únicas pessoas declaradamente LGBTQIA+ indicadas ao Oscar são: Stephanie Hsu, como Melhor Atriz Coadjuvante; Lady Gaga, em Melhor Canção Original por “Hold My Hand”, de Top Gun: Maverick; e Tony Kushner, que concorre com Steven Spielberg pelo Roteiro Original de Os Fabelmans.

Em 2022, Jeremy Blacklow, um dos diretores da Gay & Lesbian Alliance Against Defamation (GLAAD), organização que monitora como a mídia representa pessoas LGBTQIA+ nos Estados Unidos, afirmou à revista Vanity Fair que a constante ausência de personalidades abertamente homossexuais nas premiações são um reflexo da longa história de intolerância presente na indústria cinematográfica.

“Atores LGBTQIA+ há muito enfrentam uma discriminação gritante e se sentem forçados a esconder suas orientações sexuais e/ou identidades de gênero se esperam trabalhar. […] Uma vez que alguém se assume, atores e atrizes lésbicas, gays e bissexuais raramente são considerados para interpretar papéis heterossexuais. Assim como também não são chamados para interpretar personagens lésbicas, gays e bissexuais”, disse.

Discussões como essa têm importância, especialmente quando observamos que a frequência de atores e atrizes cisgêneros em papéis de personagens transexuais tem diminuído. A vitória de Jared Leto em 2014 como Melhor Ator Coadjuvante por viver uma mulher trans em Clube de Compras Dallas, por exemplo, parece improvável nos dias de hoje, graças ao destaque que os debates sobre representatividade ganharam nas redes sociais e na mídia.

Ainda assim, resta saber se daqui em diante o cenário continuará mudando e se será para o melhor. Enquanto isso, continuamos a acompanhar e celebrar as produções LGBTQIA+ que têm sido reverenciadas no calendário de premiações de Hollywood.

A 95ª cerimônia do Oscar acontece no próximo domingo, a partir das 21h (horário de Brasília). Ela será transmitida pela TNT e pela HBOMax. Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo está disponível no catálogo da Amazon Prime; Glass Onion: Um Mistério Knives Out, na Netflix; enquanto TÁR, A Baleia e Close seguem em cartaz nos cinemas.

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