“Algumas coisas são fáceis de explicar. Eu, por exemplo, sempre amei dançar e sei disso porque sou assim desde que nasci. Provavelmente algo que eu vivi lá no início da minha formação despertou o meu amor pela dança e eu desenvolvi isso dentro de mim: descobri que tinha um dom e dom, como dizem, é “defeito de fábrica”.
Descobrir e desenvolver seus gostos ao longo da vida é algo que exige tempo, aprendizado e principalmente um coração aberto. E isso vale para tudo! Eu comia couve até crua quando era criança. Depois, o tempo foi passando e, na adolescência, parei completamente de comer couve. Agora, no início da minha vida adulta, voltei a comer couve sempre que me dá vontade. Por um tempo, o gosto da couve não me atraía mais. Mas e hoje? Será que fui mudando meu paladar até gostar da couve de novo? Ou eu só estava pronta para comer a “couve certa na hora certa”?
Penso que nós, como os seres humanos e (ir)racionais que somos, temos escolhas imprevisíveis e sempre mutantes. Sim, eu sei do que se passa dentro de mim agora. Mas também sei o quanto me desenvolvi até chegar aqui e o quanto ainda posso me desenvolver. Sei que vou ter alguns amores temporários como a couve e outros eternos como a dança. O porquê eu não sei, mas sei que sou assim desde que nasci.
Independente da origem ou da forma, o amor não é fácil de explicar. De alguma forma, entendi que ele sempre esteve em mim. Eu sempre me amei, assim como também amei alguns homens (por coincidência, no mesmo período em que eu não comia couve). Jamais senti ou sequer cogitei a hipótese de me atrair por outras mulheres, principalmente porque eu já amava alguém.
Jamais senti ou sequer cogitei a hipótese de me atrair por outras mulheres
Foi então que, depois de um tempo, decidi desocupar meu coração, até porque eu já não conseguia mais ver quem eu era de verdade. Não me sentia parte dos ambientes que frequentava e ao mesmo tempo sentia falta da minha personalidade como eu mesma, a Natália, e não o anexo de alguém. Eu sempre soube que havia algo estranho e entalado por dentro de mim, mas nunca entendi direito o porquê disso. Cheguei a pensar que fosse o emprego novo ou uma crise dos 20, mas era muito mais que isso.
A realidade é que eu decidi ficar sozinha e, sozinha, descobri que sou bissexual. E isso também é difícil de explicar. Ou, às vezes, é tão fácil como a couve: eu simplesmente senti vontade. É o resto do mundo que complica. Ou pelo menos uma parte dele.
Lembro que quando eu ficava sozinha com os meus amigos gays, conseguia me sentir muito mais feliz e com a liberdade para ser exatamente da forma que eu sou. Foi aí que enxerguei em mim uma Natalia nova e sem saber direito qual era a do rolê. Mas, acima de tudo, eu curti me desenvolver sozinha.
Durante a adolescência, tive dois namoros longos – ambos com homens – e acredito que eles me deixaram não só limitada, mas principalmente acostumada a ter sempre alguém comigo. Hoje, vejo que quando estamos sozinhos conseguimos estar também em constante desenvolvimento pessoal, se conhecendo e fazendo amizade consigo mesmo. Encarar os dias incríveis de solteiro da mesma forma que as noites completamente solitárias é algo que só depende de você mesmo para que seja um momento único e especial. Eu aprendi a me defender, aprendi a chorar sem ter colo e também a lutar pelos meus sonhos acima de tudo. O amor que eu tinha por mim aumentou.
Como eu iria imaginar que, no meio desse autoconhecimento, eu me apaixonaria por uma mulher? Como um amor desses poderia fazer morada no meu coração? Justo no meu coração?!
Foi aí que eu encontrei a Lu. E a Lu ajudou a desenvolver o amor que já morava em mim, de uma outra forma. Eu me apaixonei fácil, e esse é o motivo de eu nunca ter escondido o amor que a gente tem. Confesso que no início eu senti vergonha, por não entender muito bem esse amor. Por não saber explicar para as minhas amigas (e nem para mim mesma), eu tinha medo de as pessoas acharem que eu estava apenas “brincando” de ser gay. As pessoas duvidam do amor de alguém bissexual, isso é real. Mas esse sentimento é tão vivo dentro de mim, tão latente, que não precisei de mais de dois meses para eu pedir a Lu em namoro. Não pensei em família, em preconceito e nem no que a pessoas iriam pensar do lado delas.
Eu amo a Luiza, e esse amor permanece em mim já há mais de um ano. Como se explica isso? Bem, eu resolvi ser transparente: sou o que sou e o amor que está em mim é a resposta para toda e qualquer pergunta que alguém possa ter. Foi a resposta que encontrei para os meus amigos e para a minha família. Foi a resposta que eu encontrei comigo mesmo.”
– Natália Oliveira, 22 anos