A Starz liberou um teaser inédito de Mary & George, série estrelada por Julianne Moore, Nicholas Galitzine (Vermelho, Branco e Sangue Azul) e Tony Curran, com estreia marcada para 2024 no catálogo do streaming nos Estados Unidos. Apesar de ainda não ter lançamento previsto para o Brasil, a atração criada por D.C. Moore (Killing Eve) promete unir a comunidade LGBTQIA+ e os fãs dos dramas de época com muita audácia e cenas que, só pelas imagens já divulgadas, não vou poupar sensualidade.
A trama é baseada no livro de não-ficção The King’s Assassin: The Fatal Affair of George Villiers and James I (“O Assassino do Rei: O Affair Fatal de George Villiers e James I”, em tradução livre), de Benjamin Woolley, que relata a ambição de Mary Villiers (Moore), a condessa de Buckingham, e de seu filho George Villiers (Galitzine) na tentativa de seduzir o rei James I (Curran) e conquistar a Corte da Inglaterra.
Além das cenas picantes, que já deram as caras no trailer divulgado (assista abaixo), a série também deve ajudar na divulgação de um período com personagens e acontecimentos pouco disseminados ou convenientes sobre o passado da monarquia britânica, cristalizados na figura de um dos seus integrantes possivelmente LGBTQIA+, o rei James I, tema do História Queer de hoje.
Filho único da união entre a rainha Maria da Escócia com seu segundo marido, Henrique Stuart (Lorde Darnley), e bisneto de Henrique VII da Inglaterra, James Charles Stuart (futuramente nomeado James I da Inglaterra/James VI da Escócia) nasceu no dia 19 de junho de 1566, no Castelo de Edimburgo.
Sua infância e adolescência foram um tanto atípicas para os padrões contemporâneos, mas de acordo com a aristocracia da época: com apenas 13 meses de idade, ele foi coroado Rei da Escócia, após sua mãe ter sido forçada a abdicar do trono; aos 13 anos, já foi considerado um adulto em cerimônia realizada na capital escocesa.
Tempos depois, James também foi proclamado Rei da Inglaterra, em um período conhecido como a “Era de Ouro” da literatura e dramaturgia na Idade Moderna, por ter contado com escritores como William Shakespeare, John Donne, Ben Jonson e Francis Bacon, que contribuíram para ascensão da cultura literária à época. Além de monarca, o rei também era notoriamente culto e chegou a escrever obras diversas como Daemonologie, The True Law of Free Monarchies e Basilikon Doro.
Na vida pessoal, entretanto, ele demonstrava pouco interesse em mulheres, tendo sido elogiado por sua castidade. Porém, para reforçar seu poder como membro da realeza, acabou se casando com Ana da Dinamarca, em 1589, com quem teve sete filhos.
Apesar de casado, James não foi impedido de manter seus acompanhantes favoritos (ou, como o revisionismo histórico concluiu mais tarde, concubinos/amantes), um costume típico da realeza. Sua predileção, porém, era por pessoas do mesmo gênero. Entre seus escolhidos, os mais célebres foram Esmé Stewart (o Duque de Lennox); Robert Carr (Duque de Somerset) e George Villiers, futuramente Duque de Buckingham – para quem daremos mais destaque.
A beleza e inteligência de George enfeitiçaram James quando este o conheceu em 1614. O encantamento permitiu que o pupilo começasse a receber uma série de cargos e honrarias da época, incluindo títulos de nobreza.
Ao longo de suas vidas, o rei nunca escondeu o apreço que sentia pelo futuro Duque de Buckingham. Pelo contrário, James chegou a fazer declarações públicas, tendo comparado seu amor por ele ao amor de Jesus por João.
“Eu, James, não sou um deus nem um anjo, mas um homem como qualquer outro. Portanto, ajo como homem e confesso amar aqueles que me são queridos mais do que os outros homens. Pode ter certeza de que amo o conde de Buckingham mais do que qualquer outra pessoa, e mais do que vocês que estão aqui reunidos”, assumiu em um discurso.
É possível que o relacionamento entre eles tenha sido apenas amigável, já que os padrões de masculinidade do século XVII destoam bastante do que vemos na atualidade. Porém, há quase um consenso entre historiadores de que os dois mantiveram relações sexuais. O poeta francês Théophile de Viau escreveu certa vez: “Apolo com suas canções/devastou o jovem Hyacinthus […] E é bem sabido que o rei da Inglaterra/fode o Duque de Buckingham”.
É sabido também que as cartas e poemas que James destinou a outros homens eram carregadas de teor erótico e que ele preferia a companhia deles que da sua própria mulher – sendo fisicamente afetuoso, ao ponto de envergonhar a Corte da época.
Além disso, durante a restauração do Palácio de Apethorpe, realizada na última década, foi descoberta uma passagem até então desconhecida ligando os quartos do Rei e de Villiers – o que ajudou a fortalecer a hipótese de que os dois foram, de fato, amantes.
Apesar disso, James acabou sendo um grande perseguidor da “sodomia” – nome usado na época para as práticas sexuais com o ânus. Em “Basilikon Doron”, ele a descreveu como um crime horrível e imperdoável.
Ainda assim, é inegável que, de alguma forma, o monarca nutriu muito carinho por George, mantendo-o por perto durante muitos anos, até mesmo no seu leito de morte: quando faleceu aos 58 anos, no dia 27 de março de 1625, o Duque estava ao seu lado.
Há, no entanto, duas hipóteses distintas sobre a razão da morte do Rei. A mais disseminada dentre elas é a de que James padeceu por maus cuidados médicos após sofrer um ataque violento de disenteria seguido por um derrame.
Porém, há quem assuma que ele tenha sido vítima de um assassinato, cujo algoz teria sido o amante. Esta, inclusive, é a teoria exposta no livro The King’s Assassin, que serviu de inspiração para a série Mary & George.
É impossível confirmar com total precisão a orientação sexual de James I da Inglaterra/James VI da Escócia – se bissexual, homossexual ou alguma outra possibilidade LGBTQIA+. De qualquer maneira, não restam dúvidas de que, enquanto criminalizava a prática sexual entre duas pessoas de mesmo gênero, ele mantinha relações bastante íntimas com outros homens.
Abaixo, assista ao trailer de Mary & George: