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De Trump a Lula e Marielle, perigo das fake news no Facebook aumenta

*Por Luiz Guilherme Osório

No último dia 21, o Facebook envolveu-se em um escândalo de vazamento de informações que, logo de cara, lhe custou US$ 37 bilhões em apenas 24 horas (7% do valor total de suas ações). E ao que tudo indica, os prejuízos parecem estar longes do fim. Com mais de 2 bilhões de usuários, a rede social mais usada no mundo foi acusada de vender informações de seus usuários com o “objetivo de manipular psicologicamente os eleitores nas eleições americanas de 2016 (…)”.

Os perfis, conversas e registros desses consumidores foram adquiridos pela Cambridge Analytica, empresa já conhecida pelos leitores da Híbrida. Em novembro do último ano, na reportagem Não é mera coincidência , da nossa primeira edição, nós mostramos toda a teia de comunicação desenvolvida por empresas de interpretação de dados, instituições de pesquisa e think tanks de direita, que se utilizam de ferramentas como as redes sociais para propagarem notícias falsas (as já famosas fake news) e narrativas descontextualizadas tanto na internet quanto fora dela.

Facebook admite que campanha eleitoral de Donal Trump nos EUA usou dados privados da plataforma (Foto: Sara D. Davis | Getty Images)
Facebook admite que campanha eleitoral de Donal Trump nos EUA usou dados privados da plataforma (Foto: Sara D. Davis | Getty Images)

Como explicamos, “o fenômeno das fake news levou esse nome após ser incansavelmente usado por Donald Trump para justificar o trabalho investigativo que a mídia dos Estados Unidos fez ao cobrir sua corrida às eleições, além da ajuda dúbia prestada pelo governo russo e pela Cambridge Analytica, empresa de Big Data com atuação altamente questionada nas eleições americanas e no referendum que votou pela saída da Inglaterra da União Europeia (Brexit)”.

Sediada em Londres, a Cambridge Analytica oferece campanhas para marcas e políticos que pretendem “mudar o comportamento de sua audiência”, como o próprio site da organização pontua.  Criada como subsidiária da SCL Group, do analista financeiro Alexander Nix (afastado do cargo desde quando o escândalo veio a público), a empresa já está pronta para desembarcar no Brasil e traçar sua estratégia para as eleições de 2018.

Alexander Nix foi afastado do SLC Group após escândalo envolvendo a compra de dados pela Cambridge Analytica (Foto: Divugação)

A “abrasileirada” no método será possível graças a uma parceria entre a organização e o marqueteiro André Torretta, que também participou do planejamento por trás da campanha de Donald Trump. Através da Cambridge Analytica Ponte, uma fusão entre a Ponte Estratégia, de André, e a multinacional britânica, os times já garantem que irão adaptarsuas estratégias de forma “sexy para o mercado brasileiro”.

Mas toda essa quebra de sigilo causou graves danos à imagem e às finanças do Facebook, a ponto de obrigado o próprio Mark Zuckerberg a fazer declarações acerca da segurança e das novas regras de privacidade da plataforma. Em entrevista à Ele confirmou que o Facebook  escaneia mensagens e links enviados pelo Messenger para “se certificar que as mensagens estão em alinhamento com os padrões da comunidade”.

Esse clima de insegurança e forte desconfiança entre os usuários das plataformas digitais levantou intensos debates mundo afora e culminou em algumas ações por parte das empresas de tecnologia para controlar o dano causado. Em algumas entrevistas recentes, Zuckerberg chegou a confirmar que o Facebook escaneia mensagens privadas e reafirmou publicamente que esse ano há uma grande eleição no Brasil, para a qual a plataforma deve “fazer tudo o que for preciso para garantir a integridade dessas eleições”.

A declaração veio após a empresa ter sido condenada pelo juiz Jorge Jansen Counago Novelle, da 15ª Vara cível do Rio de Janeiro, “a informar se o Movimento Brasil Livre (MBL) pagou pelo impulsionamento de posts com informações falsas” sobre o assassinato da vereadora Marielle Francono último dia 14.

Páginas do Facebook foram investigadas e suspensas após espalharem notícias falsas sobre Marielle Franco (Foto: Ricardo Schmidt)

(Leia aqui nossa entrevista exclusiva com Marielle)

O caso gerou revolta nacional e ganhou a mídia após uma publicação do MBL ter sido repassada “por engano” pela desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio, Marília Castro Neves. Em sua página no Facebook, a funcionária pública afirmou erroneamente que Marielle havia engravidado do traficante Marcinho VP e que sua candidatura teria sido garantida graças ao apoio da facção criminosa Comando Vermelho.

A acusação, contudo, foi originada pela página Ceticismo Político e replicada pelo MBL, que apenas apagou o post depois de ele ter atingido 42 mil engajamentos na rede social. Já no dia 24, o Facebook havia retirado a página do ar, alegando que ela publicava informações falsas sobre a morte de Marielle.

Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Marilia Castro replicou notícias falsas após a execução de Marielle Franco (Foto: Reprodução Facebook)

Logo depois, no dia 30, uma reportagem do jornal O Globo acusou o MBL de se utilizar do app Voxer, banido pelo Facebook, para aumentar o alcance de suas publicações na plataforma. De forma invasiva, uma das funções do aplicativo é “sequestrar o perfil dos seguidores de páginas ligadas a ele”, divulgando assim mensagens em massa e compartilhando conteúdo sem o conhecimento ou autorização do usuário. Enquanto a questão era aprofundada, vários outros sites e portais de conteúdos similares foram denunciados por ativistas e grupos de pesquisadores especializados em pesquisas de comportamento nas redes sociais.

Pablo Ortellado, pesquisador do Monitor de Debate Político no meio Digital da USP, afirmou à jornalista Juliana Gragnani, da BBC, que “a construção do boato [acerca da morte de Marielle], me pareceu sofisticada e planejada. Foi uma pequena amostra do jogo sujo que veremos na campanha eleitoral deste ano”. Mas para além do Facebook, o fenômeno já estabeleceu um padrão de comportamento conhecido pelos analistas de redes sociais, no qual as mensagens são disseminadas também por ferramentas como o WhatsApp, Twitter, Youtube e até sites de notícias.

Julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também foi permeado por notícias falsas nas redes sociais (Francisco Proer | Reuters)

Com a recente prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, neste sábado, a rede de fake news foi novamente ativada, enquanto as redes sociais foram inundadas de textos, imagens e notícias falsas, descontextualizadas ou datadas, com o objetivo de reforçar o discurso de ódio ao PT e ao campo político de esquerda. A boa notícia é que elas podem ser neutralizadas, como ficou provado no caso de Marielle, quando um time de celebridades, políticos e infuencers, liderados por Anielle Franco e Mônica Benício, irmã e viúva da ex-vereadora, exerceram pressão popular para que medidas legais fossem tomadas contra esses ataques online.

Ainda assim, na maioria das vezes, as fake news assumem seu caráter de boato e, na esfera online, continuam circulando e ressurgindo de tempos em tempos, divulgados por diferentes páginas que aparecem e desaparecem de acordo com o objetivo de seus propagadores. O perigo desses discursos reside não apenas no conteúdo que eles propagam, mas principalmente nas emoções que eles despertam através da propagação dos discursos de ódio. E, a julgar pelos primeiros meses, 2018 promete trazer ainda muitas surpresas na manipulação de dados durante as eleições.

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