Enquanto a invasão da Rússia sobre a Ucrânia segue para o seu quarto mês, com mais de 30 mil mortos no conflito, novas tropas têm sido convocadas para participarem da guerra, entre elas alguns soldados ucranianos abertamente LGBTI+. De acordo com a Reuters, eles decidiram costurar a imagem de um unicórnio em seus uniformes, logo abaixo da bandeira nacional, como forma de identificação e protesto contra o apagamento da comunidade na Rússia.

Essa prática começou durante o conflito de 2014, quando Vladimir Putin autorizou a invasão da Península da Crimeia – uma das regiões historicamente mais seguras para o povo LGBTI+ na Europa Oriental – e, mais tarde, anexou o território ucraniano à Federação Russa.

O governo pró-russo que se instalou na Crimeia através de eleições suspeitas tentou, com o apoio do kremlin, fazer com que combatentes da comunidade LGBTI+ fossem removidos de seus cargos. Naquele mesmo ano, o novo líder Sergei Aksyonov afirmou que “minorias sexuais não terão chance” na península ucraniana. “Nós não precisamos dessas pessoas”, disse.

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“Muitos falaram que não tinha pessoas LGBTI+ no exército. […] Então eles (a comunidade lésbica, gay, bissexual, transgênero e queer) escolheram o unicórnio porque é como uma criatura fantástica não-existente”, disse o ator, diretor e professor de teatro Oleksandr Zhuhan, em entrevista à Reuters.

Zhuhan e sua parceira Antonina Romanova, que se identifica como uma pessoa não-binária com os pronomes ela/dela, se voluntariaram agora para engrossar as tropas ucranianas na intenção de ajudar o país. Eles se conheceram através do teatro e se mudaram da Crimeia para a capital Kiev depois de serem deslocados em 2014. Ambos utilizam o unicórnio em suas fardas.

Oleksandr Zhuhan e Antonina Romanova utilizam a insígnia de unicórnio em seus uniformes [Foto: Edgar Su/Reuters]
Oleksandr Zhuhan e Antonina Romanova utilizam a insígnia de unicórnio em seus uniformes [Foto: Edgar Su/Reuters]
No momento, há o temor de que, caso a invasão na Ucrânia seja bem sucedida, leis anti-LGBTI+ sejam impostas na região por Putin. “Porque o que a Rússia faz não é apenas pegar nossos territórios e matar nosso povo. Eles querem destruir nossa cultura e… não podemos permitir que isso aconteça”, contou Zhuhan.

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Apesar de ter descriminalizado relações entre pessoas do mesmo sexo, a Rússia aprovou em 2013 uma lei polêmica de “anti-propaganda LGBT“, na qual proíbe que casais homossexuais demonstrem afeto em público, de qualquer maneira. “Essa lei diz que informações sobre homossexualidade não podem ser passadas para crianças. Ela proíbe que menores de idade tenham acesso a isso, mas também não diz especificamente o que seria ‘isso'”, explicou Natalia (nome fictício), membro da ONG Russian LGBT Network, à Híbrida.

Putin, que nunca escondeu ser homofóbico, também apoiou (mesmo que de maneira mais “discreta”) os “campos de concentração” para pessoas LGBTI+ que foram denunciados na Chechênia, em 2017 (leia aqui nossa matéria especial sobre o caso). A história publicada em primeira mão pelo jornal Novaya Gazeta, surgiu como o ápice de uma longa jornada anti-LGBT promovida pelo líder checheno Ramzan Kadyrov, que seguia de forma mais agressiva os passos de seu líder e aliado Putin.

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Separados da Crimeia e da Ucrânia pelo Mar Negro e pelo pensamento retrógrado contra pessoas LGBTI+, os países do Cáucaso são conhecidamente conservadores e preconceituosos contra a comunidade. Na Chechênia, muitos dos LGBTI+ perseguidos e torturados nas prisões clandestinas foram denunciados pela própria família, que temia cometer o “crime de honra”.

A principal religião nos países caucasianos é uma mistura do islamismo com o cristianismo, o que na mão dos conservadores certos vira um prato cheio para a execução de pessoas LGBTI+. No Iraque, o Alcorão é inclusive usado para justificar que elas aconteçam em praça pública.