Mais um ano terminando e, com o fim, chegam também nossas listas da Retrospectiva 2023, recapitulando os melhores momentos dos últimos doze meses. No cinema, tivemos excelentes lançamentos em meio a um período marcado pelo retorno de cineastas celebrados, como Martin Scorsese, David Fincher, Kleber Mendonça Filho e Sofia Coppola; sucessos de bilheteria, como Barbie e Oppenheimer; além da greve dos sindicatos de atores e roteiristas de Hollywood.
Para o público LGBTQIA+, o ano também não decepcionou: ganhamos filmes plurais e marcantes que, de alguma forma, tiveram dilemas sobre orientação sexual e identidade de gênero explorados como aspecto narrativo.
Para montar esta lista com os 13 filmes LGBTQIA+ que marcaram 2023, optamos por destacar os mais relevantes, diante dos termos citados acima – excluindo portanto aqueles em que a representatividade de pessoas queer esteve apenas por trás das câmeras, como é o caso de Segredos de um Escândalo, de Todd Haynes. Assim, escolhemos seis títulos nacionais e outros sete internacionais que, de uma forma ou de outra, ajudaram a aumentar a nossa visibilidade pela sétima arte.
De opções já disponíveis em plataformas de streaming e outras ainda rodando pelos cinemas ou exclusivas dos festivais nacionais, pelo menos por ora, confira a seleção abaixo.
Melhores filmes LGBTQIA+ de 2023:
-
“Anatomia de uma Queda” (Justine Triet)
O francês Anatomia de uma Queda (Anatomie d’une Chute) teve uma trajetória invejável neste ano: de vencedor da Palma de Ouro, em Cannes, a queridinho das premiações tradicionais, incluindo indicações ao Globo de Ouro que abriram ainda mais o caminho para que concorra a Melhor Filme no Oscar 2024. Assistindo-o, é fácil compreender o por quê: Justine Triet criou um longa-metragem complexo e intrigante sobre a dinâmica conjugal.
Na história, Sandra (a sempre excelente Sandra Hüller) é a principal suspeita do possível homicídio de seu marido, Samuel (Samuel Theis), encontrado morto nos arredores do chalé da família nos Alpes. A personagem principal, descobrimos, é bissexual, e sua orientação sexual é usada como indício do crime pela acusação – ressaltando o machismo e LGBTfobia presentes no processo jurídico francês. O filme passou por aqui na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e vai para o circuito aberto de exibição em 22 de fevereiro. Veja o trailer abaixo.
-
“Assexybilidade” (Daniel Gonçalves)
No documentário brasileiro Assexybilidade, Daniel Gonçalves (de Meu nome é Daniel) explora um assunto ainda pouco debatido no audiovisual, procurando desmistificar tabus e preconceitos que existem até mesmo dentro da comunidade LGBTQIA+: as histórias e vivências sobre a sexualidade de pessoas com deficiência. Figurou por aqui no Festival do Rio e no Mix Brasil, com previsão de estreia nacional para o primeiro semestre de 2024. O trailer do filme tem indicação etária para maiores de 18 anos e pode ser assistido aqui.
-
“Clube da Luta para Meninas” (Emma Seligman)
Em Clube da Luta para Meninas (Bottoms), Josie (Ayo Edebiri) e PJ (Rachel Sennott) são duas alunas não muito populares no ensino médio e que decidem criar um – literal – clube da luta, na intenção de conquistar as líderes de torcida Isabel (Havana Rose Liu) e Brittany (Kaia Gerber).
Apesar do decepcionante título nacional – “Passivonas”, como uma tradução quase literal de “Bottoms”, seria muito mais cômico e interessante -, esta comédia consegue se destacar pelo elenco (especialmente Edebiri, uma das grandes revelações do ano) e sua própria personalidade millennial, marcada principalmente nas piadas e na trilha sonora, que conta com músicas como “Complicated”, de Avril Lavigne, e “Party 4 U”, de Charli XCX. É, em resumo, uma espécie híbrida de Superbad (2007) e Fora de Série (2019), com a já queridinha Rachel Sennott na equação. Esta é, inclusive, a segunda parceria entre a atriz e Seligman, que trabalharam juntas no hilário e desconfortável Shiva Baby, de 2020. Disponível no catálogo da Prime Video.
-
“Levante” (Lillah Halla)
Premiado em Cannes pela Federação Internacional de Críticos de Cinema (Fipresci), Levante, da brasileira Lillah Halla, conta o dilema de Sofia, uma jovem jogadora de vôlei que engravida e decide fazer um aborto fora do país. Ayomi Domenica Dias, Loro Bardot, Onna Silva e Lorre Motta são alguns dos nomes no elenco desta trama impactante e cada vez mais atual. O longa já está no circuito comercial francês e também foi exibido no Festival do Rio e no Mix Brasil, mas ainda não tem data de estreia nos cinemas do Brasil.
-
“Orlando, Minha Biografia Política” (Paul B. Preciado)
Paul B. Preciado é um dos mais importantes intelectuais do século XXI, a partir de obras reveladoras como Testo Junkie e Manifesto Contrassexual. Já em Orlando, Minha Biografia Política, sua estreia como cineasta, ele reúne 25 pessoas diferentes, trans e não-binárias, interpretando a personagem fictícia criada originalmente por Virginia Woolf, em 1928. O documentário francês venceu o Prêmio Teddy, na última Berlinale, e foi indicado ao Critics Choice Awards, provando que o talento de Preciado vai para além de seu trabalho como filósofo e escritor. No Brasil, ele foi exibido no Festival Varilux de Cinema Francês, em novembro, mas ainda não chegou aos catálogos do streaming.
-
“Passagens” (Ira Sachs)
Não há melhor cena de sexo lançada este ano do que a protagonizada por Franz Rogowski (um dos melhores atores alemães em atividade) e Ben Whishaw, em Passagens (Passages). É uma sequência longa, explícita e que explora bem o corpo dos atores, revelando mais camadas sobre o casal e o contraste de um deles com a personagem interpretada por Adèle Exarchopoulos. É uma cena que não apenas cumpre uma função narrativa, como também serve de resistência (mesmo que não almeje a tal) à opinião equivocada e tão disseminada pela geração Z de que cenas de sexo em filmes são desnecessárias.
Ira Sachs construiu um filme adulto, maduro e honesto sobre a complexidade dos relacionamentos amorosos, além de um exemplo sufocante (e, em alguns momentos, engraçado) sobre a toxicidade de uma pessoa muito provavelmente narcisista. Disponível na Mubi.
-
“Pedágio” (Carolina Markowicz)
Neste longa da brasileira Carolina Markowicz, Suellen (Maeve Jinkings) é uma cobradora de pedágio que percebe que pode usar seu trabalho para ganhar uma renda extra ilegalmente. A intenção? Financiar a ida de seu filho, Tiquinho (Kauan Alvarenga), a um retiro de cura gay organizado por um famoso pastor evangélico estrangeiro. Pedágio foi um dos pré-selecionados para a vaga de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar 2024 e venceu quatro das categorias principais no Festival do Rio deste ano. O longa está atualmente em exibição nos cinemas brasileiros.
-
“Rotting in the Sun” (Sebastián Silva)
Parte sátira, parte crítica social, Rotting in the Sun (ainda sem título em português) traz seu diretor, o chileno Sebastián Silva (um dos grandes nomes do cinema queer da atualidade), como um cineasta viciado em ketamina que encontra no influenciador Jordan Firstman uma nova inspiração. O filme estreou no Festival de Sundance e ganhou fama por exibir cenas de nudez frontais e sexo explícito sem muita parcimônia. Essa audácia, junto ao olhar plural de Silva, tornam-o uma experiência memorável e uma das mais interessantes de 2023. Disponível no catálogo da Mubi.
-
“Sem Coração” (Nara Normande e Tião)
Verão de 1996, litoral de Alagoas. Tamara (Maya de Vicq) está aproveitando suas últimas semanas na vila pesqueira onde mora antes de partir para Brasília. Ao ouvir falar de uma adolescente apelidada de Sem Coração por causa de uma cicatriz que tem no peito, ela começa a sentir uma atração crescente pela menina misteriosa. Maeve Jinkings, Kaique Brito, Erom Cordeiro e Alaylson Emanuel integram o elenco do longa, que é escrito e dirigido pela dupla Nara Normande e Tião, e inspirado no curta de mesmo nome. O filme também passou pelo Festival do Rio, mas ainda não tem data de estreia confirmada para o restante do país.
-
“Todos Nós Desconhecidos” (Andrew Haigh)
Inspirado num romance de Taichi Yamada, Todos Nós Desconhecidos (All Of Us Strangers), de Andrew Haigh, já ganhou o público antes mesmo de sua estreia, simplesmente por trazer Andrew Scott (o padre de Fleabag) e Paul Mescal (o pai de Aftersun) como o casal principal. Na trama, Adam (Scott) é um escritor que tem a vida abalada após encontrar seu misterioso vizinho (Mescal). À medida que se aproximam, Adam é levado de volta à casa em que cresceu, onde descobre que os pais falecidos estão vivos e com a mesma aparência de 30 anos atrás.
O drama britânico foi elogiado por sua sensibilidade e já começou a dar as caras na atual temporada de premiação, recebendo indicações no British Independent Film Awards, no Independent Spirit Awards e na lista de 10 melhores lançamentos do ano pela reverenciada National Board of Review. Chega aos cinemas brasileiros a partir de 29 de fevereiro.
-
“Toda Noite Estarei Lá” (Suellen Vasconcelos e Tati Franklin)
Suellen Vasconcelos e Tati Franklin debatem transfobia e religião no documentário Toda Noite Estarei Lá, que acompanha a rotina e luta da cabelereira trans Mel Rosário, impedida de frequentar a igreja evangélica Assembleia de Deus. O filme reflete as tensões dos últimos anos no Brasil, incluindo o governo ultraconservador de Jair Bolsonaro e a pandemia, a partir do universo de Mel. Ainda sem data de estreia no circuito nacional.
-
“Tudo Que Você Podia Ser” (Ricardo Alves Junior)
Vencedor dos troféus de Melhor Direção na mostra Première Brasil Novos Rumos e do Prêmio Especial do Júri na mostra Félix, ambos do Festival do Rio, este documentário de Ricardo Alves Jr. acompanha a saga de Aisha em seu último dia em Belo Horizonte, se despedindo das melhores amigas Bramma, Igui e Will. Tudo Que Você Podia Ser é um retrato afetuoso do que decidimos chamar de família. Ainda sem data de estreia no circuito nacional.
-
“Vermelho, Branco e Sangue Azul” (Matthew López)
A comédia romântica, disponível no catálogo da Prime Video, é baseada no livro homônimo de Casey McQuiston e conquistou o público por sua leveza, dispensando a tragédia e sofrimento comumente associadas às narrativas LGBTQIA+ no cinema. Ter Uma Thurman no elenco e a química entre os atores Taylor Zakhar Perez e Nicholas Galitzine (que também aparece muito bem em “Clube da Luta para Meninas”) também ajudou a tornar Vermelho, Branco e Sangue Azul um ótimo conto de fadas queer. Leia nossa crítica completa sobre o filme aqui.