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Oscar 2024: presença de filmes LGBT+ aumenta entre os indicados; confira a lista completa

Após uma sequência de anos mornos e fracos pós-pandemia, a atual safra do Oscar, enfim, parece trazer mais entusiasmo. As previsões, é claro, podem já estar um tanto quanto óbvias: ninguém duvida do favoritismo de Oppenheimer como o grande vencedor da noite e nem da estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante para Da’Vine Joy Randolph por Os Rejeitados, a exemplo; mas, tratando-se de representatividade LGBTQIA+, os filmes indicados em 2024 superam – e em muito – os de anos anteriores.

Não se pode negar que ainda há um longo caminho a ser percorrido, com a busca por maior diversidade de atores/atrizes, personagens e histórias voltadas à comunidade em Hollywood. Porém, há sim o que celebrar neste ano, seja pela qualidade de boa parte dos filmes, seja pelo talento das pessoas envolvidas nessas obras.

Abaixo, confira os principais destaques (e rejeições) LGBTQIA+ dos indicados ao Oscar 2024, que acontece neste domingo (10):

As chances de Donald Trump retornar à Casa Branca no próximo ano são altas e, antes mesmo disso, estados e municípios dos Estados Unidos já vêm enfrentando uma onda de conservadorismo, refletida no crescimento dos pedidos de censura a livros, incluindo os de temática LGBTQIA+ ou de educação sexual nas escolas e bibliotecas públicas do país. Em O ABC da Proibição de Livros, produzido pela MTV, acompanhamos a perspectiva dos estudantes sobre o assunto, enquanto a hipocrisia da “terra da liberdade” é exposta. Indicado a Melhor Curta-Metragem.

Uma das grandes sensações do ano, Anatomia de Uma Queda conquistou Cannes no primeiro semestre de 2023 e seguiu forte até o final desta temporada, firmando-se uma das maiores apostas para a concorrida categoria de Roteiro Original. Na protagonista bissexual Sandra, Justine Triet, diretora e roteirista, assim como a atriz Sandra Hüller (enfim colhendo, no mainstream, os louros de uma invejável carreira) construíram uma personagem multifacetada em narrativa que expõe a complexa dinâmica de gênero em um relacionamento conjugal.

O sucesso de Barbie já era esperado, afinal, seria o primeiro live action de uma das bonecas mais adoradas de todos os tempos sob a direção de uma cineasta competente (Greta Gerwig) e com um elenco estrelado (Margot Robbie, Ryan Gosling e até Dua Lipa). Ainda assim, o filme supreendeu: não só se tornou o grande campeão das bilheterias de 2023, como virou um dos principais indicados ao Oscar deste ano. Billie Eilish, nossa musa declaradamente bissexual, deve levar para casa a estatueta de Melhor Canção Original com “What Was I Made For?” – se a profecia se concretizar, este será o segundo careca de ouro na estante da cantora (ela venceu a mesma categoria em 2022, por “No Time to Die”, da saga 007).

Em Ficção Americana, Thelonious “Monk” Ellison (Jeffrey Wright) é um autor em crise após ter sido rejeitado pela editora por não ter uma obra “suficientemente negra”. Ao perceber, através de Sinatra Golden (Issa Rae), o tipo de conteúdo que o público está interessado, ele então decide escrever um romance satírico na intenção de expor o mundo editorial. Dirigido por Cord Jefferson, o filme conquistou a Academia com 5 indicações e dividiu algumas opiniões, mas um consenso parece ter surgido no personagem Cliff (Sterling K. Brown, indicado a Coadjuvante), irmão gay do protagonista: quem viu, garantiu que ele é o grande destaque.

Já ovacionada em cerimônias anteriores, Lily Gladstone é o principal nome nos bolões, ao lado de Emma Stone (Pobres Criaturas), para a categoria de Melhor Atriz, por Assassino da Lua das Flores. Também pudera: sua expressividade e vulnerabilidade traduziram a dor de toda uma geração de povos nativos no filme de Martin Scorsese, de maneira que sua personagem não se reduzisse a mero token. Recentemente, a atriz revelou se identificar com o uso de pronomes neutros por acreditar que eles ajudam a “descolonizar o gênero”.

A ambiciosa biopic, dirigida e estrelada por Bradley Cooper, segue muito dos apelos de filmes do gênero: figura querida como condutor da história, maquiagem proeminente e diversas entrevistas do ator na turnê de divulgação, falando à exaustão sobre como lutou para se preparar pro papel principal. Porém, Maestro acaba adotando também uma inversão de expectativa do que se espera de um obra sobre um dos maiores condutores do século XX: em vez de dar enfoque exclusivo à carreira musical de Leonard Bernstein, o filme se dedica a abordar o relacionamento do compositor com a esposa Felicia Montealegre (Carey Mulligan) e suas constantes puladas de cerca com outros homens, expondo os indícios de sua bissexualidade. Deve sair de mãos vazias da cerimônia.

Em Nimona, uma adolescente com poderes mágicos decide ajudar um cavaleiro acusado de um crime que não cometeu. O longa foi inspirado no quadrinho de ND Stevenson e fez burburinho antes mesmo de chegar à Netflix: desde 2015, seus direitos estavam sob domínio da Disney, que posteriormente descartou a obra por, aparentemente, estar incomodada com a presença de um beijo gay na trama. No fim, quem saiu perdendo foi o próprio conglomerado multimilionário, já marcado por um histórico problemático com relação à comunidade LGBTQIA+: Nimona não só foi sucesso de críticas, como é um dos queridinhos ao prêmio de Melhor Animação.

Nyad não apenas traz a história de uma sujeita lésbica ao centro – a nadadora Diana Nyad, interpretada pela cinco vez indicada Annette Bening (este ano, concorrendo como Melhor Atriz) -, como também tem um ícone LGBTQIA+ em papel de destaque: a multitalentosa Jodie Foster (Melhor Atriz Coadjuvante) como a treinadora Bonnie Stoll. Não há grandes chances de vitória para o título, mas ficamos contentes em ver duas das melhores atrizes de suas gerações serem reconhecidas mais uma vez, mesmo que não seja pelo melhor dos filmes.

Pobres Criaturas pode não ser, por definição, uma história completamente LGBTQIA+, mas não podemos ignorar que um dos principais pontos frisados (até excessivamente) no filme é a audácia da protagonista Bella Baxter (Emma Stone) em, ao longo de sua jornada, apresentar comportamentos desviantes aos valores normativos da sociedade: das experiências sexuais plurais a enxergar no seu breve romance com outra mulher uma forma mais madura e humana de se relacionar. Diante disso, dá pra dizer que podemos abraçar a heroína da obra de Yorgos Lanthimos como, no mínimo, queer.

Negro, gay e ativista, Bayard Rustin foi conselheiro de Martin Luther King Jr. e dedicou sua vida à busca pela democracia e igualdade racial, enfrentando o racismo e a homofobia da década de 1960 nos EUA. Sua trajetória política durante a a Marcha sobre Washington por Trabalho e Liberdade é a inspiração para este longa do dramaturgo George C. Wolfe. Embora tenha passado despercebido pelo catálogo da Netflix, o filme recebeu uma indicação ao Oscar: o também gay Colman Domingo concorre na categoria de Melhor Ator. Não vai ganhar, mas amaremos vê-lo na cerimônia e no tapete vermelho, já que, nesta temporada, ninguém tem quebrado tanto a monotonia do dress code para homens como ele. Saiba mais sobre Rustin em nossa coluna História Queer.

OS ESNOBADOS DO OSCAR 

O filme ganhou festivais pela maneira como retrata a vida de suas protagonistas: quatro mulheres trans, negras (Koko Da Doll, Daniella Carter, Liyah Mitchell e Dominique Silver) e profissionais do sexo nas noites de Nova York e Georgia, EUA, que não perdem o otimismo mesmo diante dos dados alarmantes sobre a realidade violenta das pessoas transgêneras. Kokomo City: A Noite Trans de Nova York chegou a participar do “Oscar do cinema independente”, o Independent Spirit Awards, mas ficou de fora do circuito mainstream.

Frank Rogowski merecidamente figurou nas listas das premiações de associações de críticos por sua visceral interpretação como o caótico e bissexual Tomas em Passagens. A expectativa de que ele chegasse às cerimônias televisionadas era baixa, afinal, o filme de Ira Sachs ganhou injustamente a classificação etária mais restritiva ao chegar nos cinemas dos EUA por conter uma cena de sexo entre dois homens. Não deu outra: o alemão foi esnobado, assim como diretor, obra e colegas de elenco (incluindo o assumidamente gay Ben Whishaw). Uma lástima, já que este foi um dos grandes destaques do último ano.

Goste ou não, é inegável que a internet foi completamente tomada por Saltburn quando o filme chegou ao catálogo do Prime Video: das fancams dedicadas a Jacob Elordi à viralizada de “Murder on a Dancefloor” no TikTok, fazendo justiça a uma música lançada há mais de 20 anos. Porém, de cliques e streamings não se faz uma indicação, e a obra visualmente estimulante, mas narrativamente tediosa de Emerald Fennell sequer foi lembrada nas categorias técnicas do Oscar 2024. Quem sabe se tivesse mais umas cenas da bunda do Berry Keoghan ele teria dado as caras como consolação?! Fica pra próxima.

É uma pena que Todos Nós Desconhecidos tenha morrido na praia do BAFTA e conquistado holofotes em Hollywood somente (e brevemente) durante o Globo de Ouro nesta temporada. O romance estrelado por Adam Scott e Paul Mescal foi aclamado por sua sensibilidade, surpreendendo muitos que imaginavam que ele se ancoraria apenas no carisma, beleza e possível pink money de seus protagonistas como casal gay. Torcemos para que os próximos trabalhos de Andrew Haigh tenham mais repercussão dentro da Academia.

Um dos mais intrigantes diretores LGBTQIA+ da contemporaneidade, Todd Haynes retornou em 2023 após um hiato de 8 anos com o já memorável Segredos de um Escândalo. Apesar da recepção positiva e da presença, mesmo que ínfima, nas cerimônias que antecedem o Oscar (como Globo de Ouro e Critics Choice Awards), o filme passou quase que despercebido pela Academia, exceto pela indicação a Roteiro Original. Haynes merecia muito mais.

A 96ª edição do Oscar vai ao var neste domingo, 10/03, a partir das 19h (tapete vermelho) e 20h (cerimônia), com transmissão ao vivo na televisão pela TNT e MAX (antiga HBO Max) via streaming.

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