Desde a revelação de que a Walt Disney Company fez doações a políticos envolvidos no projeto de lei Don’t Say Gay, a empresa tem sido alvo de críticas do público e dos próprios funcionários. E não é para menos: além de financiar uma ementa que visa isolar – ainda mais – a população LGBTI+ na Flórida, Estados Unidos, o histórico de representatividade, dentro da própria empresa e nos produtos comercializados por ela, é bastante problemático, mesmo que publicamente ela tente pregar o contrário.

No último mês, o ator Josh Gad, que interpretou LeFou na adaptação cinematográfica mais recente de A Bela e a Fera, declarou que não ficou satisfeito com o resultado do filme. Anunciado antes da estreia como protagonista da “primeira cena gay da Disney”, a única cena explícita que LeFou protagonizou a respeito de sua sexualidade foi quando apareceu dançando com outro homem ao final do longa.

“Eu não acho que fizemos justiça ao que um personagem realmente gay em um filme da Disney deveria ser. Esse não foi LeFou. […] Se vamos nos vangloriar, então poxa, deveríamos ter ido mais longe com isso. Todos merecem uma chance de se verem na telona, e acho que não fizemos o suficiente para isso”, disse em entrevista ao The Independent.

A fala do ator foi publicada após o adiamento indefinido da série derivada da fábula por “decisões criativas”, de acordo com o Disney+. Gad faria parte do elenco e chegou a dizer que esperava aprofundar melhor a sexualidade de LeFou no projeto.

Pouco tempo depois da entrevista de Gad, no dia 8 deste mês, o site Popular Information revelou que a empresa realizou doações milionárias a autores do PL Don’t Say Gay. A notícia revoltou funcionários e fãs da Disney, que acabaram intensificando suas críticas à companhia, especialmente quanto à sua falta de representatividade – dentro e fora das telas.

Abaixo, entenda melhor as acusações envolvendo a Disney, sua aliança com o Don’t Say Gay e as críticas realizadas por integrantes ou aliados da comunidade LGBTI+:

Funcionários acusam Disney Pixar de censurar histórias LGBTI+

Em carta aberta publicada na Variety, no dia 9 de março, funcionários da Disney Pixar afirmaram que a Walt Disney Company tem exigido cortes de quase todos os momentos abertamente gays dos enredos, mesmo que as equipe criativas e de liderança protestem a favor da representatividade.

“Nós, da Pixar, testemunhamos lindas histórias, cheia de personagens diversos, serem reduzidas a migalhas do que eram antes. Mesmo que a criação de conteúdos LGBTI+ sejam a resposta para combater leis LGBTFóbicas ao redor do mundo, éramos impedidos de fazer isso”, escreveram.

Pixar se defende, mas não nega acusações

Em comunicado oficial pelo Twitter, na última terça-feira (15), a Pixar afirmou que se coloca “junto aos colegas, amigos, familiares e fãs LGBTI+ ao redor do mundo, que são alvos de leis que marginalizam e diminuem suas identidades e vidas”, mas não negou as acusações de que Bob Chapek, o atual CEO da empresa, doou mais de R$ 1 milhão em apoio ao Don’t Say Gay, nem que tenha censurado histórias LGBTI+ em seus projetos.

Marvel se pronuncia contra lei anti-LGBT

Uma das marcas mais lucrativas do conglomerado Disney tomou a dianteira antes de sua “mãe” se posicionar oficialmente e publicou nas redes sociais, durante a última terça-feira (15), que denuncia “fortemente toda e qualquer legislação que infringe os direitos humanos básicos da comunidade LGBTI+”.

“A Marvel Studios se posiciona a favor da esperança, inclusão e força; e orgulhosamente nos colocamos junto da comunidade. Hoje, prometemos continuar nosso forte compromisso como aliados que promovem os valores de igualdade, aceitação e respeito”, divulgaram, em nota.

Bob Chapek, o atual CEO da Disney, acusado de doar mais de R$ 1 milhão em apoio ao Don't Say Gay [Foto: Reprodução]
Bob Chapek, o atual CEO da Disney, acusado de doar mais de R$ 1 milhão em apoio ao Don’t Say Gay [Foto: Reprodução]

Lightyear restaura cena de beijo lésbico

Uma cena do filme “Lightyear“, pré-sequência focada num dos protagonistas da trilogia “Toy Story” com lançamento previsto para 17 de Junho deste ano, foi restaurada de acordo com funcionários da Pixar. O momento em questão envolve um beijo entre a personagem Hawthorne, dublada por Uzo Aduba, e outra mulher. A notícia foi divulgada no dia 18 pela Variety, logo após as críticas que a companhia vem recebendo por seu apoio ao PL Don’t Say Gay e o problemático histórico de representatividade em suas obras.

Disney+ se pronunciou e tentou se afastar da marca-mãe

O serviço de streaming Disney+ seguiu o exemplo da Marvel e veio à público se pronunciar contra o projeto de lei Don’t Say Gay. Em um post publicado no Twitter no último dia 22, a empresa disse que se coloca junto a seus funcionários, colegas, familiares, contadores de história e fãs LGBTI+. “Nós fortemente denunciamos todas as legislações que infringem os direitos humanos básicos das pessoas da comunidade LGBTQIA+ — especialmente a legislação que mira e fere jovens e suas famílias. Nós nos esforçamos para criar um serviço que reflita o mundo em que vivemos, e nossa esperança é ser uma fonte de inclusividade, empoderamento e histórias autênticas que nos unem na nossa humanidade compartilhada”, escreveram.

Jessica Chastain tece críticas a Disney no tapete vermelho do Oscar

No tapete vermelho da cerimônia que ocorreu no domingo (27), Jessica Chastain, vencedora do Oscar de Melhor Atriz por “Os Olhos de Tammy Faye“, criticou a empresa. “Acho que é importante as pessoas tomarem uma posição contra leis discriminatórias e preconceituosas. Não importa quem você seja, não importa qual empresa é a sua, acho que qualquer coisa discriminatória, faça um grupo se sentir separado do todo, é algo que falta amor e precisa ter uma contraresposta rápida e afirmativa”, disse.

Oscar Isaac também se manifestou contra a empresa

O ator, integrante do elenco do próximo filme da Marvel, “Moon Knight“, não escondeu o descontentamento com a Disney ao ser entrevistado por um repórter da Variety no dia 22. “Eu acho que meu comentário seria [começa a cantar] gay, gay, gay, gay, gay, gayyyyy! É, é uma lei absolutamente ridícula. É insana. É insanidade. E espero que a Disney, como uma companhia, se oponha o mais fortemente possível contra essa ideia. É absurdo que isso existe neste País”, disse, ao ser questionado sobre a Don’t Say Gay. Além de “Moon Knight”, Isaac já participou de outras produções da Marvel/Disney, como a saga “Star Wars“.

Disney se manifesta contra a Don’t Say Gay após ser sancionada

Em declaração publicada nesta segunda-feira (28), após o governador da Flórida Ron DeSantis sancionar a Don’t Say Gay no Estado, a Walt Disney Company se comprometeu em ajudar na revogação da lei.

“Nosso objetivo como uma companhia é para que essa lei seja revogada pela legislação ou derrubada nos tribunais, e nós nos mantemos dedicados a apoiar as organizações nacionais e estaduais que estão trabalhando para conseguir isso. Nós estamos dedicados a apoiar os direitos e a segurança dos integrantes LGBTI+ da família Disney, assim como a comunidade LGBTI+ da Flórida e do restante do País”, afirmaram.

O que diz a lei Don’t Say Gay?

Aprovado pelo Senado da Flórida, EUA, no dia 8 de março, o projeto de lei Parental Rights in Education Bill [Projeto de Lei Pelos Direitos dos Pais Sobre a Educação], popularmente batizado Don’t Say Gay, pretende proibir qualquer discussão relacionada ou sequer a menção a orientação sexual e/ou identidades de gênero nas escolas de ensino fundamental do Estado.

No dia 28 de março, a ementa foi sancionada pelo governador Ron DeSantis, do Partido Republicano, que já havia sinalizado apoio anteriormente, dizendo que a lei pretende tornar o sistema educacional “transparente” para os pais. Saiba mais sobre a Don’t Say Gay aqui.