O Brasil se manteve pelo 17º ano consecutivo como o líder em assassinatos de travestis e transexuais em todo o mundo. Segundo o boletim mais recente da Transgender Europe (TGEU), o país corresponde a 30% dos 350 homicídios dessa população desde a última atualização, no ano passado.
O monitoramento da TGEU começou ainda em 2008. Desde então, o Brasil é o país com o maior número de homicídios dessa população em todo o mundo. O total registrado ao longo do último ano, entretanto, só será divulgado em 20 de novembro, quando é celebrado o Dia Internacional da Memória Transgênero.
Segundo a organização, o boletim de 2024 teve um dos maiores índices desde o início do projeto. Em comparação, o relatório do ano passado contabilizou 321 vítimas, o que significa um aumento de quase 10% no período.
Ao mesmo tempo em que o Brasil lidera o ranking entre os países, a nossa região também não destoa tanto dessa realidade. Seguindo a tendência dos boletins anteriores, a América Latina e o Caribe representam 73% de todos os casos notificados ao longo do último ano.
Perfil das vítimas
Continuando o perfil inicial registrado pela TGEU ainda em 2008, a grande maioria das vítimas reportadas no último se identificava com o gênero feminino (94%).
Dentre as profissões, trabalhadoras do sexo ainda estão mais vulneráveis e correspondem a 46% das vítimas. Apesar da ainda ser maioria, a incidência sobre o grupo tem diminuído nos últimos anos. No primeiro boletim, o recorte representava 84% do total, por exemplo.
Outra tendência que aumentou em relação ao último boletim é a incidência de crimes contra a pessoas trans pretas. Essa população ainda constitui o principal perfil da vítimas e correspondeu a 93% de todas as mortes, um aumento de 14% em relação ao ano passado.
A maioria das vítimas tinha entre 31 e 40 anos, em média. Também foram registradas 15 mortes de adolescentes com menos de 18 anos.
Na Europa, os casos caíram pela metade, diminuindo de 16 para oito registros. Na contramão, os Estados Unidos observaram um aumento dos homicídios transfóbicos, saltando de 31 para 41.
Assassinatos de pessoas trans e discurso de ódio online
Em um comunicado oficial, a TGEU comentou o alto número de homicídios registrados no boletim: “Sem dúvidas, isso é uma consequência dos esforços concentrados de movimentos anti-gênero e contrários aos direitos, que instrumentalizam e vilificam pessoas transexuais para impulsionar agendas políticas anti-democráticas maiores”, disse a organização.
“Temos visto um crescimento consistente nos níveis dos discursos de ódio e crimes de ódio online e offline, especialmente de atores políticos, religiosos e ‘líderes da fé’, pessoas públicas”, continuou a TGEU. “Esse crescimento é impulsionado pela falta de uma legislação forte contra discursos de ódio que proteja a identidade e a expressão de gênero e a desinformação manipuladora que resulta em uma falta de responsabilização das empresas de mídias sociais por não garantirem a integridade da informação.”
No início de 2023, o Twitter/X removeu as regras de moderação que impediam conteúdos de transfobia no site e passou a permitir que os usuários usem o “nome morto“ de pessoas trans ou possam se referir a elas pelo gênero errado. A mudança de diretriz foi implementada logo após a compra da plataforma pelo bilionário Elon Musk, recém-apontado por Donald Trump como um de seus futuros ministros.
A política que classificava como “assédio” o uso incorreto e proposital do gênero e do nome morto (dado ao nascimento, antes da transição) em referência às pessoas trans existia no Twitter desde 2018. Desde o início, a remoção dessa regra gerou preocupações sobre uma possível permissão para que discursos transfóbicos espalhem-se e multipliquem-se livremente pela rede social.