Na coluna de setembro com os principais lançamentos musicais de artistas nacionais e internacionais LGBTQIA+, Fabiano Moreira* comenta o novo disco de GA31, os EPS de Evehive, Mykki Blanco e Venusto além dos singles de Zéza, Mika, Leffs, Keiynan Lonsdale, Jaloo, Gabeu e Dornelles.
Abaixo, confira a seleção. E não deixe de seguir a nossa playlist para não perder os próximos lançamentos.
GA31 – “Planeta GA31“
Há exatamente um ano, falei aqui da artista conhecida como GA31, que fez fama na internet com uma voz sintetizada, tipo de ajudante virtual, como a Siri, sobre bases eletrônicas que são o fervo clubber. Planeta GA31 é o seu sexto álbum, coroando nove anos de sucesso e profícua produção musical, sempre sem mostrar o rosto, com temas relacionados ao universo LGBTQIA+ e boa música. “Lésbica Futurista” é um hit, inclusive na Rússia, onde viralizou. Planeta GA31 tem participação da drag Frimes, que a gente AMA, em “Pleasure”, além de usar e abusar da Inteligência Artificial (IA) na criação dos visuais, da capa aos clipes.
“Na capa, temos essa figura de sereia surrealista, sozinha numa espécie de satélite natural, orbitando num sistema de planetas desconhecido. Me inspirei nas fotografias de Nick Knight, como a capa do álbum Born This Way, de Lady Gaga. Metade fantasia, metade humano. Uma ilustração das habilidades de transformação e reinvenção. Ilustra também o fato de se considerar um ‘peixe fora d’água’, um ‘outsider'”, me contou, pelo chat do insta, usando pronomes masculinos.
Mykki Blanco – “Postcards from Italia“
Em outubro do ano passado, falei aqui do introspectivo Stay Close To Music, último álbum de Mykki Blanco, pioneiro do rap queer e eleito pela Billboard como “uma das vozes artísticas mais originais e imprevisíveis da última década”. Ele acaba de lançar o EP Postcards from Italia, produzido novamente em colaboração com o músico e produtor eletrônico FaltyDL, mostrando uma nova faceta sua nessa “era de cowboy italiano”, com camadas adicionais de música de dança Euro dos anos 90 e acid house. O EP começa com “Magic on my back”, um blues bop sexy repleto de riffs cativantes. O artista está em tour pela Europa, em uma série de festivais, com show no Pitchfork Music Festival Berlin em 4 de novembro.
Venusto – “Atravessa Pele“
Pansexual não-binário, o brasiliense Venusto estreia com o EP de MPB suingada Atravessa Pele (Venusto), no qual mostra suas habilidades vocais e swag. Cineasta e arte-educador, Venusto estudou flauta, lira e canto na infância, musicalidade esta que transborda no trabalho, regado a “Djavan no violão” em “Gatinha33”. O EP tem produção musical de Fernando Jatobá (Remobília) e Rafael Ops e traz música negra brasileira da melhor qualidade, inspirada por nomes como Djavan, Dona Ivone Lara, Cartola, Luedji Luna, Liniker e Mayra Andrade. Além de “Gatinha33” (“Topa topa topa?”), “Tagarelá” e “Pele” também ganharam clipes. Venusto estudou cinema na Academia Internacional de Cinema (SP) e na New York Film Academy (NY/EUA) e música no Conservatório Souza Lima (SP) e na Berklee College of Music (Boston/EUA). Promete.
EVEHIVE – “PISA PISA”
DJ dos bons que despontou em festas como a Velcro e a Mamba Negra, EVEHIVE acaba de lançar seu segundo EP, o fervido e divertido PISA PISA. “Toca pra elas”, diz a faixa de abertura, “Bala solta”. Natural de São Gonçalo, no Rio de Janeiro, ele vive atualmente em São Paulo. A dualidade entre o que é bruto e delicado é um ponto focal do EP, no qual o artista habilmente oscila, amplificando contrastes. Numa miscelânea de texturas, ora vibrantes, ora densas, Evehive desenvolve uma sinfonia que transmite sensação de alegria. E muito fervo, como na outra faixa inédita, “Vo socá”. O visual do EP tem uma divertida brincadeira com coturnos e o som tem mixagem do amigo DJ b o u t. O lançamento é da MAMBArec. Pra fechar a tampa, o DJ faz “fumaça igual dragão” e toma “chá de cucetinha” na maconhista “Fazer fumaça”, com as participações de Zaila e Pamka nos vocais, na “qual pega no rolê, mas não responde no whatsapp”. Essa foi direto pra minha playlist “Tem alguém queimando coisa”.
Zéza – “Jesus e o Orixá”
Eu já falei aqui que a cultura ballroom é a revolução em curso, o hip-hop das gays, tudo o que a gente quer ser. Pois o artista queer carioca Zéza acaba de lançar o clipe poderoso de “Jesus e o Orixá”, inspirado pela sonoridade do hit “Levitating”, da cantora Dua Lipa, mas tendo o ballroom como linguagem. “Eu quero ver Jesus voltar / de braço dado com meu Orixá / em posição de lótus / como um avatar”, diz a letra, que evoca a “fé no pix, irmão”, e decreta que “tudo isso é corpo vivo do que você chama de Deus”. A música combate o fundamentalismo e o racismo religioso e dá protagonismo às culturas preta e LGBTQIA+. O single faz parte do álbum Bicha Mandingueira, que será lançado em outubro, pelo selo Colmeia22. Fiquei curioso.
Mika – “C’est La Vie”
“C’est la vie” é o primeiro single do próximo álbum do britânico Mika, todo em língua francesa, oui oui. É, segundo o texto de divulgação, uma “canção de libertação, resiliência e hino ao amor, às revoluções íntimas que ainda nos tornam seres em construção”. “C’est la vie” ecoa outra música em francês de sua autoria, “Elle me dit” (2002), o manifesto de um homem que acorda uma manhã e diz: “finalmente sou eu, mais rico a partir de seu passado, pronto para abraçar o futuro”. Mika nos promete que ser feliz depende, acima de tudo, de nós mesmos. “C’est la vie” é também uma homenagem à sua mãe. Como Mika canta na música, alguns meses antes de sua morte, ela desenhou um retrato de seu filho com uma cabeça florida para o seu aniversário.
Leffs – “Saliva”
Essa quem me mandou foi o Irakytan, personagem recente aqui da página de Londrina, no Paraná. Pois é de lá que vem também Leffs, cantora e compositora paranaense, “artista travesty” que usa sua voz como ferramenta para questionar estruturas sociais e propor novas possibilidades. Ela já lançou um EP, Quarentena Eletrohits, ainda de barba e peito cabeludo, e quatro singles. “A ideia de que pelos são uma característica necessariamente masculina é um discurso colonial, misógino e etarista”, militou pelo chat do insta. “Saliva” fala sobre a dinâmica de posse nas relações e o seu processo de cura com guitarras e sintetizadores. O clipe foi captado e editado pela produtora Fenda, com direção de Max Miranda e coreô que evoca os braços de Shiva. Em seus últimos lançamentos, Leffs se uniu a Chá di Lirian, DJ e produtor musical paranaense. Achei bafo e aguardo é mais.
Keiynan – “Come Papi”
Cada mergulho é um flash no clipe vem-verão do ator, dançarino e cantor australiano Keiynan Lonsdale, que tá bem sereio no filme sexy e leve de “Come Papi”, no qual ele promete que vai mostrar sua masterpiece enquanto curte uma viagem romântica. Ui, geral sentiu! Fato que papi está um gato no clipe e a música é bem gostosinha, com batidas R&B, vocais suaves e sintetizadores, aquela “magia colorida” da Marina Lima, mas com melanina. Keiynan começou sua carreira como ator e dançarino e teve alguns papéis em programas como Razzle Dazzle: A Journey Into Dance e All Saints, mas foi seu trabalho na Dance Academy, interpretando o estudante gay Ollie, que o lançou ao estrelato. Depois, vieram Love, Simon, The Divergent Series: Insurgent e, mais recentemente, The Flash. Este é o quinto single depois do álbum de estreia, Rainbow Boy (2020). Ele fez seu outing como bissexual em 2017, mas, em 2022, asumiu-se gay. Australiano, ele nasceu em Sydney, filho de pai nigeriano e mãe australiana. Deu bom demais.
Jaloo – “Mau”
Acho que eu ainda não tive a oportunidade aqui, na Híbrida, de dizer o quanto sou fã da Jaloo, essa artista inventiva e potente do Pará e que, além de fazer tudo e carregar o pop brasileiro nas costas, é atriz, como mostrou em Paraíso perdido. E ainda tem tempo de ser simpática e educada. Depois de dois álbuns lindos com Os Amantes, lá em “Cotijuba”, a artista, que se identifica com o gênero fluido, anuncia o seu terceiro álbum solo. O primeiro single, “Mau”, ganhou clipe com roteiro e direção seus e inspiração em um jogo de videogame ou o velho cara de batata em versão digital, contando com diversos atores para revelar o novo look da artista, com cabelão e “macaquinhos no sótão”. A faixa aborda sentimentos e prazeres do ser humano, comparando-os ao instinto de um animal. O terceiro álbum vai encerrar uma trilogia idealizada pela artista desde a produção do primeiro, sendo uma grande celebração ao feminino e colocando no foco temas como prazer, liberdade e risco. Nesta quinta (28), ela lançou o segundo single do álbum, a eletrônica, visceral, dançante e apimentada “Quero te ver gozar”. A faixa aborda a dificuldade de lidar com o prazer do outro.
Gabeu e Dornelles – “Colo da Tropa”
Se tem dois artistas queer jovens que eu admiro e sempre dou espaço aqui na coluna são Gabeu, o filho de Solimões indicado ao Grammy latino que estava nos melhores álbuns de 2021, com seu disco de estreia, o delicioso Agropoc; e Dornelles, divo funkeiro carioca que esteve na quarta página que fiz aqui, com o hit “Queimado”, e vem aparecendo sempre que lança algo, pois a bicha é babado. Foi a gente quem pediu e veio o feat, o maravilhoso “Colo da Tropa”. “Ah, eu sei que dói, viver galopando na fivela do cowboy”, diz a letra da música, ahahahaha, que ganhou clipe com motos envenenadas, figurinos country fetichistas, dedo no c* e gritaria. O single segue a linha de trabalho de Gabeu neste ano, explorando sonoridades e gêneros musicais, mas mantendo o tempero sertanejo de suas raízes. “Nossa marra é de cowboy, nosso estilo mandelão”, avisa a letra. Shantay, you both stay, mamãe ama vocês.
A redação também está ouvindo:
Tension, Kylie Minogue
Truque, Clarice Falcão
“Vilã Live”, Ludmilla
“Lusco-Fusco”, Assucena
“A Dona Aranha”, Luísa Sonza
“Bongos”, Cardi B e Megan Thee Stallion
“El Jefe”, Shakira e Fuerza Regida
“On My Love”, Zara Larsson e David Guetta
“Got Me Started”, Troye Sivan
Problematique, Kim Petras
“roses”, Kelly Clarkson
CHAI, CHAI
Scarlet, Doja Cat
Darkpop, Cleo
“A braba é ela”, Pocah
“Me lambe”, Jão
Belezas são coisas acesas por dentro, Filipe Catto
*Fabiano Moreira é jornalista desde 1997 e já passou pelas redações de O Globo, Tribuna de Minas, Mix Brasil, RG e Baixo Centro, além de ter produzido a festa Bootie Rio. Atualmente, é colunista da Sexta Sei.