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Nikolas Ferreira escapa de cassação, mas segue atacando pessoas LGBTQIA+

Processo de cassação contra Nikolas Ferreira foi arquivado pelo Conselho de Ética depois de cinco meses (Foto: Pablo Valadares | Câmara dos Deputados)

Processo de cassação contra Nikolas Ferreira foi arquivado pelo Conselho de Ética depois de cinco meses (Foto: Pablo Valadares | Câmara dos Deputados)

Mais de cinco meses depois, o Conselho de Ética e Decoro da Câmara dos Deputados decidiu nesta quarta-feira, 9, arquivar o processo de cassação de Nikolas Ferreira (PDT-MG) pelo episódio lamentável de transfobia protagonizado pelo parlamentar na tribuna daquela mesma Casa. No mesmo dia, ele voltou a atacar a população LGBTQIA+ durante uma sessão com a ministra da Saúde, Nísia Trindade.

Relator do caso, o deputado Alexandre Leite (União Brasil – SP) mudou de opinião durante a sessão. Inicialmente, ele tinha decidido dar continuidade ao processo que poderia cassar o mandato do colega pelas falas e atitudes transfóbicas que ele protagonizou no último Dia Internacional da Mulher, celebrado em 8 de março.

O apoio à não cassação de Nikolas Ferreira acabou por unir não apenas os parlamentares de seu partido e aliados, como os da oposição. Washington Quaquá (PT-RJ), por exemplo, disse considerar “errado” o que o colega fez, mas não quis “entrar no mérito da discussão”. “Essa comissão deve falar para todos os deputados que, a partir de agora, não toleraremos nenhuma quebra de decoro no plenário ou nas ações dos mandatos”, afirmou.

“Isso aqui virou uma rinha, uma briga de galo. Todo mundo processa todo mundo, e este Conselho vai cada dia mais perdendo a sua função, uma vez que a gente tem discutido coisas muito menores. Nós precisamos rever esses procedimentos”, disse também o deputado Mário Heringer (PDT-MG).

Após ouvir as defesas dos colegas, Alexandre Leite optou por arquivar o processo de cassação contra Nikolas Ferreira, contradizendo a sua própria decisão inicial e recebendo o apoio de 12 deputados, enquanto apenas 5 votaram contra o arquivamento.

“O que aconteceu naquele dia, embora tenha boas intenções, foi grave, diante do cenário de violência que vivemos, da falta de legislação específica e nós estarmos sendo legislados pelo Supremo. Levando tudo isso em consideração, acredito eu que não seja oportuno levar isso adiante no Conselho de Ética”, disse Alexandre Leite, optando apenas por uma advertência em forma de “censura escrita”.

Transfobia de Nikolas Ferreira no Dia Internacional da Mulher

Em 8 de março, Dia Internacional da Mulher, Nikolas Ferreira atacou a população travesti e transexual durante um discurso na Câmara. Usando uma peruca, ele disse que naquele dia “se sentia mulher”, respondia pelo nome “Nikole” e teria “local de fala” para ser ouvido na data.

“As mulheres estão perdendo seu espaço para homens que se sentem mulheres. Para vocês terem ideia do perigo que é isso, eles estão querendo colocar a imposição de uma realidade que não é a realidade”, disse Nikolas. O deputado justificou a fala como uma forma de defender “um pai não querer que um marmanjo de dois metros de altura entre no banheiro da filha sem ser considerado um transfóbico”.

Logo após a sessão, ele foi repudiado por colegas parlamentares, como as deputadas Sâmia Bomfim (PSOL – SP) e Tabata Amaral (PSB – SP). Na mesma tarde, o Ministério Público Federal também pediu que a Casa também apurasse a conduta do bolsonarista por “suposta violação de ética”, o que resultou no processo arquivado nesta quarta.

Nikolas Ferreira repete ataques à população LGBTQIA+

Mais cedo, nesta mesma quarta-feira, Nikolas Ferreira protagonizou mais um barraco na Câmara dos Deputados, desta vez com a ministra da Saúde, Nísia Trindade. O episódio ocorreu durante uma sessão promovida pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle, formada em sua maioria por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.

“Vocês estão querendo reduzir mulher a apenas mulheres que menstruam. Pergunto: um homem tem condição de menstruar? Você já viu algum homem tendo condição de gestar ou a senhora acredita nessa capacidade, ministra?”, disse Nikolas.

O deputado fazia referência à Resolução nº 715/2023, aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) no último dia 20. Entre as orientações propostas no documento, uma das propostas é a redução da idade mínima para hormonização na transição de gênero, dos 18 para os 14 anos. A diretriz, entretanto, não tem caráter deliberativo e pode ser descartada pelo governo federal durante as formulações finais do Plano Plurianual e do Plano Nacional de Saúde, que guiam as políticas públicas nessa área.

“É importante reconhecermos a complexidade da sexualidade humana como toda a tradição científica vem nos orientando”, respondeu a ministra, depois de ter repreendido o tom com o qual o deputado se dirigiu a ela. Questionada novamente por ele sobre o mesmo assunto, ela reiterou: “Nem vou comentar bizarrices”.

LGBTfobia segue impune

Antes de ter seu processo de cassação arquivado, Nikolas Ferreira recebeu o apoio da Procuradoria-Geral da República ainda em maio. Segundo documento assinado pela vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, as declarações transfóbicas do deputado estariam cobertas por imunidade parlamentar.

Logo após o discurso em questão, Nikolas já tinha negado em suas redes que teria praticado transfobia durante o episódio e se justificou afirmando que estava apenas “defendendo o direito das mulheres”. Nesta quarta, ele voltou a se esconder sob os argumentos de “liberdade de expressão” e “perseguição política”.

A tática é a mesma utilizada por outro conservador mineiro, o pastor André Valadão, que tem feito uma série de pregações contra a comunidade LGBTQIA+ nos últimos meses. Durante o episódio mais recente, ele chegou a insinuar que homossexuais deveriam ser assassinados.

Após a repercussão negativa das falas, Valadão recuou e disse que foi mal interpretado. Impunes, ele e Nikolas seguem livres para continuar atacando a população LGBTQIA+ com discursos de ódio, incitação à violência e fake news.

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Em 2019, o Supremo Tribunal Federal entendeu finalmente que a discriminação com base em identidade de gênero e orientação sexual equivale ao racismo e deve ser tratado como tal. Ainda em janeiro deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou a decisão e decretou que crimes desse tipo são inafiançáveis, imprescritíveis e podem resultar em uma pena de 2 a 5 anos de reclusão.

Por que essa lei não parece ser aplicável a pessoas como André Valadão e Nikolas Ferreira segue um mistério.

Veja como votou cada deputado

Abaixo, veja como cada deputado votou no processo que poderia cassar o mandato de Nikolas Ferreira.

Favoráveis ao arquivamento do processo de cassação contra Nikolas Ferreira:

Contrários ao arquivamento do processo de cassação contra Nikolas Ferreira:

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