Híbrida
BRASIL

25 projetos, nomes, memes e lutas que marcaram os LGBT+ em 2017

Se teve um ano difícil para ser brasileiro, esse ano foi 2017. O primeiro aniversário do golpe trouxe um desmonte de direitos praticamente inédito na nossa história recente e, para quem faz parte de minorias como a comunidade LGBT+, foi como viver sob uma nuvem insistente de incertezas e ameaças constantes. Mas ainda assim, resistimos como pudemos. E celebramos, debochamos, revidamos e rebolamos bem na cara dos conservadores. Por isso, essa retrospectiva traz as lutas, mas também homenageia aquelas pessoas, projetos e iniciativas que alegraram nosso ano e o ajudaram a ser mais suportável, com mais orgulho e autoconfiança para sermos quem quisermos. Confira:

MEMES

Na frente da minha salada?
Hoje, basta ter conexão com a internet para ter acesso ao universo pornográfico e, consequentemente, sua coleção de enredos bizarros. E enquanto os filmes gays são mestres em situações nonsense, uma cena improvisada da Men.com viralizou após a atriz Nikki V (sim, ela foi identificada e com bastante orgulho da repercussão) fica ultrajada ao ver que o boy está transando na frente de sua salada. Óbvio, logo a frase foi adaptada para qualquer situação, como “Vocês tão falando de heterofobia na frente da minha salada?”.

Gretchen em “Swish Swish”
Maria Odete aka Gretchen é onipresente na internet há anos e tem sido capaz de ilustrar todos os sentimentos do ser humano apenas por gifs. A versatilidade e o sucesso foram tão grandes que, em julho, ela foi convidada por Katy Perry (MORTA! LINDA!) para o lyric video de uma das melhores faixas do “Witness”. O resultado ganhou na loteria: os brasileiros, donos extraoficiais da cultura online, se certificaram de que a parceria fosse hit instantâneo – e rendesse uma fonte inesgotável de memes.

Babadook  is shook
Uma classificação duvidosa na Netflix, um comentário posterior no Tumblr e bum, o Babadook se tornou o mais aleatório, inusitado e divertido “aliado” da comunidade LGBT+. Para quem não o conhece, ele é o grande vilão de um terror homônimo, como uma espécie de metáfora para a depressão que ninguém nem se importa mais desde que descobriram que o combo capa + chapéu “significa”. A cereja do bolo? Não contente com o novo ícone, a internet ainda tratou de shippar Babadook e Pennywise, de “It – A Coisa”, como um casal queer.

Yukê?!
Nenhum sucesso no Brasil está completo antes de se tornar meme, e se teve alguém que conseguiu ambos os feitos este ano foi Pabllo. Além de ser um dos principais tópicos do ano (mais abaixo), a cantora e seu timbre de voz ao gritar “E o quê?” nas performances ao vivo ganharam inúmeros memes e paródias na esfera online. Duvida? É só esperar um de seus hits tocar em uma balada LGBT+ que dá pra ouvir os gritos de “Yukeeee” ecoando pela pista.

O sereio do Arpoador
Mais que um meme ou um viral, um estilo de vida. Batendo suas barbatanas na onda do sereismo, o carioca Davi Moreira, conhecido como Davi Sereio, virou febre após ser descoberto pelo repórter Yuri Fernandes em uma matéria para o Ego. Ganhando a vida à beira-mar com cauda e conchas no pescoço, o rapaz chamou até a atenção de Glória Perez para a novela “A Força do Querer” e deu um novo propósito à vida de quem sempre foi fã d’A Pequena Sereia.

MÚSICA

“Flutua” – Johnny Hooker com Liniker
Highlight do álbum “Coração”, a parceria entre dois dos nomes mais promissores e interessantes da nova geração musical gerou um verdadeiro hino para a liberdade do amor, com letra politizada e produção jazzista que só potencializa o vozeirão de ambos. Quer mais? O clipe, lançado na véspera do Natal, leva roteiro de Daniel Ribeiro (“Hoje eu quero voltar sozinho”) e é estrelado por Jesuíta Barbosa e Maurício Destri como um casal descobrindo o amor e a homofobia na pauliceia desvairada.

“Pajubá” – Linn da Quebrada
Um dos álbuns nacionais mais importantes do ano,“Pajubá” expressou a força, o talento e a singularidade de uma das artistas mais polêmicas e reais do país. A versatilidade de gêneros musicais e temas abordados no disco mostra que Linn ainda tem muito o que falar, como você pode conferir na nossa matéria de capa com ela 

Sua Cara” Major Lazer com Anitta & Pabllo Vittar
Ambas as cantoras tiveram destaque como nenhuma outra no cenário brasileiro em 2017. Pabllo começou seu reinado ainda no Carnaval, quando a colaboração com Rico Dalasam em “Todo dia” foi o hino extraoficial da folia, iniciando um sucesso que seguiria ao longo do ano com singles como “K.O.” e “Corpo Sensual”, com Mateus Carrilho. Anitta se tornou a carioca de maior projeção mundial na história, e fez de seu check mate uma verdadeira aula de direcionamento, marketing e talento. A união dessas duas com a produção de Diplo por trás fez com que o hit perdurasse até hoje pelas rádios e baladas, transcendendo o público LGBT+ e alcançando a massa de forma definitiva.

“Berro” – Heavy Baile com Lia Clark & Tati Quebra Barraco
Subverter uma gíria em música é algo que o funk faz muito bem, obrigado. Quando a música em questão traz um ícone do gênero e uma representante da nova geração, coroadas com a produção afiada do Heavy Baile, o hit é certo. “Berro” pode ter sido lançada há pouco, mas é uma promessa quentíssima para o verão. Leia aqui nossa entrevista com Leo Justi, do Heavy Baile, sobre a faixa.

“Tô na rua” – Banda Uó
Pode ser o fim ou o intervalo de uma era, mas fato é que a Banda Uó vai fazer falta. Principalmente após o single de despedida do grupo, “Tô na rua”, ter mostrado uma faceta mais versátil e madura de Candy Melody, Mateus Carrilho e Davi Sabbag, provando que o trio amadureceu musicalmente desde os dias de “Shake de amor”.

CINEMA & TV

“Divinas Divas”
Apesar de o documentário ter passado na edição 2016 dos festivais, sua estreia em circuito comercial foi apenas nesse ano. Marcando o début de Leandra Leal por trás das câmeras, o filme traça um panorama do Teatro Rival e seu histórico de resistência LGBT+ durante a Ditadura Militar, usando como figuras centrais ícones como Rogéria, Jane Di Castro, Eloína dos LeopardosCamille K, Fujika de Holliday, Marquesa e Brigitte de Búzios. A narrativa emociona e faz rir na mesma dosagem, conquistando uma importância histórica e social para a cena queer carioca aos moldes do que foi “Paris is burning” nos anos 1990.

Amor & Sexo”
Fernanda Lima sempre foi uma aliada da comunidade LGBT+ e seus programas o foram com ela. Mas em sua temporada 2017, o “Amor & Sexo” mergulhou ainda mais fundo nessa temática, com o já antológico episódio em que Liniker, Linn da Quebrada, Gloria Groove e As Bahias e a Cozinha Mineira se apresentaram no auditório para falar sobre os índices de assassinato da população travesti e transexual no Brasil. Visibilidade, debate e bom humor são sempre ferramentas bem vindas no combate ao preconceito e quanto maior o alcance, melhor.

Corpo Elétrico”
Com uma direção sensível e que foge aos estereótipos recorrentes em filmes de temática queer, Marcelo Caetano mostra um romance atípico entre dois rapazes – interpretados por Kelner Macedo e Welkett – recém-chegados a São Paulo e com muitas experiências pela frente. O ponto de partida é a fábrica de tecidos onde os jovens trabalham, mas a labuta acaba se tornando uma porta de entrada para um mundo de bixices bem mais gritantes, com direito a participação de Linn da Quebrada mostrando o mundo alternativo da capital paulista.

“A Força do Querer”
Glória Perez sempre tentou incluir discussões LGBT+ em suas novelas, vide que o primeiro beijo entre dois homens deveria ter acontecido ainda em “América” (2005). Mas o veto da emissora e a rejeição do público impediram que ela assinasse essa antologia televisiva. Não faz mal: ela voltou 12 anos depois com a história mais humana e inclusiva sobre transição de gênero a aparecer no horário nobre. O trabalho de artistas como Silvero Pereira e Carol Duarte, com desempenhos excepcionais, só fez aumentar a comoção e a discussão em torno do tema.

Leia aqui uma entrevista exclusiva com Silvero.

E leia aqui uma matéria especial sobre o que pessoas transexuais e travestis da vida real acharam da abordagem de “A Força do Querer”.

Entre Irmãs”
Após fazer bonito no Festival do Rio, o épico dirigido por Bruno Silveira e estrelado por Marjorie Estiano e Nanda Costa foi transformado em minissérie pela Rede Globo e traz uma mensagem mais do que necessária: chega de encaixar mulheres e a sexualidade feminina em padrões primários e pré-estabelecidos.

Leia aqui sobre a representação de sapatões no cinema nacional

PERSONALIDADES

Renata Carvalho
Atriz e transexual, Renata virou notícia ao ver a peça “O Evangelho segundo Jesus, Rainha do Céu” ser censurada duas vezes, em Salvador e em Jundiaí. Mas os limões viraram limonada: ela aproveitou a atenção para dar visibilidade à luta da população transgênero por visibilidade e representatividade. Ao invés de deixar-se levar pelo ódio, Renata fez campanha para mostrar como é importante que a comunidade seja ouvida e vista, e de quebra ainda promoveu iniciativas como o Coletivo T e Representatividade Trans Já.

Leia aqui uma entrevista exclusiva com Renata sobre a importância de empregarmos pessoas trans e travestis.

Valentina Sampaio
Desde Lea T. que o Brasil não tem uma modelo trans tão bem sucedida na moda. E se alguém brihou nessa indústria em 2017 foi Valentina. A menina conseguiu para si uma capa solo na Vogue Paris ainda em agosto, participou de um desfile de lingerie em “A Força do Querer” e há quem jure que seu nome já é cotado para ganhar um par de asas da Victoria’s Secret.  Isso sem contar com a sua estreia nos cinemas em “Berenice Procura”, na qual ela contracenou ao lado de Claudia Abreu e recebeu elogios de todo o elenco pela desenvoltura e pelo talento.

Leia aqui uma entrevista exclusiva com Valentina sobre o início da carreira de atriz e o sucesso meteórico.

Jean Wyllys
Somos uma revista 100% independente e sem nenhuma afiliação com partido político algum – inclusive temos críticas a todos. Mas é inegável a luta que Jean (PSOL) tem travado incansavelmente na Câmara dos Deputados contra os retrocessos do governo vigente e a favor da visibilidade e garantia de direitos das minorias. Em contrapartida, ele é alvo constante de fake news e ataques de ódio online, o que só aumenta seu fôlego e disposição para continuar atento e forte.

Leia na nossa primeira edição uma entrevista exclusiva com Jean sobre a ascensão da extrema direita, a articulação dos movimentos sociais no Brasil e como combater as fake news.

Fernanda Gentil
Desde que Fernanda assumiu seu relacionamento com Priscila Montadon, a jornalista tem dado um show à parte de bom humor e falas lúcidas no combate ao preconceito. Além de ter se pronunciado contra os vários absurdos do ano, a apresentadora também compartilhou abertamente como trata a questão com seu filho, vide o vídeo abaixo, extraído de um episódio do “Saia Justa”.

Pabllo Vittar
Pabllo foi o nome LGBT+ mais comentado no Brasil em 2017 e sobre isso é aquele já velho ditado: atura ou surta. A cantora foi protagonista de um sucesso astronômico ao longo do ano e em qualquer roda de conversa que você chegasse, alguém tinha alguma opinião a respeito dela. Mas enquanto criticavam seu timbre, sua dança, suas músicas e seu visual, Pabllo continuou brilhando e servindo como exemplo de que é possível superar o preconceito e sair vitoriosa no final. Com simpatia, humildade e talento, ela se tornou um case de sucesso e inspiração para todxs.

PESADELOS

Cura gay
Poucas notícias deram tanta certeza de que o país vive um retrocesso para os LGBT+ do que a decisão do juiz Waldemar Claudio de Carvalho, do Distrito Federal, em permitir que a homossexulidade seja tratada como distúrbio psicológico, contrariando a decisão de 1990 da Organização Mundial da Saúde. Apesar de o assunto ter virado meme, com direito a atestado médico e tudo, a pauta é séria e ainda pode ser aprovada. Inclusive, o Conselho Federal de Psicologia já afirmou que irá recorrer da decisão.

Dandara e os casos de transfobia
Dandara dos Santos era uma travesti de 42 anos que foi morta a pauladas em plena luz do dia no interior do Ceará. O vídeo do crime é chocante, indigesto e, infelizmente, retrato de uma realidade que corre o Brasil todos os dias, em todos os cantos. Não à toa, a população trans tem uma expectativa de vída de 35 anos no país, que também bateu o recorde por mortes de LGBT+ em 2016. Dandara foi uma em meio a milhares e exemplo claro de que a luta está longe de ter fim.

Censura e “ideologia de gênero”
Provando que nada está tão ruim que não possa piorar, outro termo vergonhoso que os brasileiros precisaram encarar em 2017 foi a “censura”. Graças a “líderes” da extrema-direita, a caretice e a violação à liberdade de expressão foram fortes ao longo do ano, atingindo exposições, artistas, programas, músicas, videoclipes e tudo o mais que fosse responsável por disseminar a “ideologia de gênero”. O pretexto era defender as crianças, mas o objetivo real foi criar uma cortina de fumaça em torno de problemas maiores e incitar o ódio. Vide o exemplo abaixo.

Prostituição infantil no interior do Piauí
Um garoto de 13 anos foi largado pelo pai para dormir na cela de um homem preso por estupro. Se os defensores da boa moral tivessem se indignado com esse caso metade do que se revoltaram com uma criança no museu, daria até para comprar a balela de que eles realmente se importam com a integridade dos jovens desse país. O caso é revoltante e, mais uma vez, retrato de crimes que acontecem com mais frequência do que gostaríamos de admitir. Mas enquanto esse pai específico foi preso, é bom lembrar que se a luta pelos direitos humanos ainda encontra empecilhos nas grandes capitais, o buraco no interior do Brasil é bem mais embaixo.

A Parada de Resistência LGBTI do Rio
E falando nas grandes capitais, é difícil imaginar uma cidade que tenha sido mais reprimida do que o Rio de Janeiro sob a administração do bispo Marcelo Crivella (PRB). Além da podridão abjeta e vergonhosa que foi seu vídeo sobre o Queermuseu ir “para o fundo do mar”, a sua arbitrariedade com qualquer tipo de evento cultural que não seja para promover a Igreja Universal e a negligência com áreas periféricas da Cidade Maravilhosa, o prefeito também fez questão de não apoiar a Parada do Orgulho LGBTI. Mas pelo menos essa batalha ele perdeu: com financiamento coletivo e colaborações, o Grupo Arco-Íris conseguiu colocar seus trios na Avenida Atlântica. E que agora comecem os jogos para o Carnaval 2018.

Leia aqui uma matéria exclusiva sobre a 22ª Parada do Orgulho LGBTI do Rio.

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