Sam Elliott, famoso por ter protagonizado filmes de faroeste ao longo de sua carreira e, mais recentemente, ter integrado o elenco da última regravação de Nasce Uma Estrela, ao lado de Bradley Cooper e Lady Gaga, causou polêmica nesta semana ao participar do podcast WTF With Marc Maron“. O motivo foi o comentário que teceu a respeito do longa Ataque dos Cães (“The Power Of The Dog”), dirigido por Jane Campion e indicado a 12 estatuetas de ouro no Oscar deste ano, celebrado no próximo dia 28.

“Onde está o faroeste neste faroeste? Levei isso para o pessoal, amigo. […] Eles estão todos correndo com chaps [aquelas calças de couro com abertura alongada nas partes genitais] e sem camisa. Há todas essas alusões à homossexualidade ao longo de toda a porra de filme”, disse, além de comparar os cowboys do longa à “dançarinos eróticos”.

O comentário de Elliott foi visto como homofóbico, especialmente ao se considerar que “Ataque dos Cães” funciona como uma crítica ao universo sexista e permeado de masculinidade tóxica que rodeia a cultura western a partir da performance de Benedict Cumberbatch como um cowboy agressivo por conta da repressão de sua homossexualidade.

Nas redes sociais, diversos usuários criticaram as falas do ator, incluindo a própria Netflix – detentora dos direitos do filme – que, num toque bem humorado, postou uma imagem do longa com a fala: “Ele é só um homem. Só mais um homem”.

Obras que envolvem a temática LGBTI+ não costumam ser as queridinhas do Oscar. Em 2006, O Segredo de Brokeback Mountain perdeu, surpreendentemente, a estatueta de Melhor Filme para o medíocre Crash – No Limite por, de maneira análoga a Ataque dos Cães, versar sobre a homossexualidade num universo repressivo de cultura viril e homofóbica.

O filme de Ang Lee conta a história de dois vaqueiros que se apaixonam e foi um marco à época de seu lançamento por trazer duas grandes estrelas hollywoodianas, Heath Ledger e Jake Gyleenhaal, trocando beijos e carícias. Recentemente, a obra voltou aos holofotes quando o diretor Pedro Almodóvar declarou que se arrependeu de não tê-lo dirigido.

“Eu fiquei muito triste de não ter dito sim [para a proposta de dirigir o longa]. Triste no sentido de que amava a história de Annie Proulx [em que o filme foi baseado] e também o roteiro. Mas eu me conheço, e sabia que precisaria de muito mais sequências sexuais do que as que tiveram no filme. Embora tivesse sido assegurado de que poderia fazer o que eu quisesse fazer, a maneira como entendi o sexo entre os dois personagens foi quase animalesca. Eu teria incluído muitas cenas de sexo, e não acredito que eles realmente permitiriam. Eu amo o filme de Ang Lee, mas na minha versão, os dois homens não estariam apaixonados – seria algo completamente físico”, declarou o diretor espanhol à revista W.

"O Segredo de Brokeback Mountain", de Ang Lee [Foto: Reprodução]
“O Segredo de Brokeback Mountain”, de Ang Lee [Foto: Reprodução]
Embora O Segredo de Brokeback Mountain tenha perdido a principal estatueta do Oscar, outro longa com temática LGBTI+ fez história – e, por que não, reparação – ao levar o prêmio de Melhor Filme para a casa na cerimônia de 2017: Moonlight – Sob A Luz do Luar.

Os tempos, portanto, são outros, e os comentários de Elliott, que refletiam o pensamento de boa parte dos votantes da Academia há até pouco tempo, não devem causar tanto impacto atualmente. Considerando o favoritismo de Ataque dos Câes, que tem se firmado como um dos protagonistas desta temporada, é bem possível que a Academia prove como o pensamento do ator está ultrapassado e que hoje há mais espaço para o reconhecimento de uma história que não glorifique a masculinidade presente em obras de faroeste.

“Ataque dos Cães” está disponível para streaming no catálogo da Netflix. Assista ao trailer abaixo: