Depois de Peru e Panamá registrarem casos de transfobia pela forma como implementaram uma quarentena contra o coronavírus baseada em gênero – homens e mulheres só podem sair de casa em dias alternados -, relatos similares começam a surgir em outros três países da América Latina. Apesar de terem adotado medidas de distanciamento social diferentes, Argentina, Colômbia e Honduras já têm casos de violação dos direitos da população trans durante a pandemia da covid-19.

Em Bogotá, capital colombiana, a prefeita Claudia López adotou desde a segunda-feira (13) a medida “Pico Y Género”, com as mesmas regras de revezamento entre homens e mulheres que foram aplicadas no Peru e no Panamá. Já na quarta (15), dois dias depois de a nova quarentena ter sido implementada, o professor de ioga Joseph relatou ter sido expulso de um supermercado pelo próprio gerente, que não aceitou o rapaz ter saído no dias destinado aos homens.

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Em vídeo publicado pela Red Comunitaria Trans, Joseph narra como foi tratado no gênero feminino pelo segurança do supermercado, que se referiu a ele como “senhorita”, e logo depois foi expulso do local pelo gerente: “Ele me disse, de maneira bem odiosa, que eu precisaria abandonar o estabelecimento porque não era o dia que correspondia à minha saída, por causa do meu sexo”.

Uma petição já com mais de 3.700 assinaturas foi publicada por ativistas e organizações não-governamentais de proteção aos direitos humanos, pedindo à prefeita Cláudia para suspender a regra da quarentena, “que desrespeita os direitos de pessoas trans, não-binárias e com expressão de gênero não-hegemônica”. Até o momento, nada foi feito.

O mesmo desrespeito à identidade de gênero foi gravado na Argentina, quando três travestis foram detidas a caminho do supermercado, no Barrio de Constitución, em Buenos Aires. Apesar de o país não ter restringido a circulação alternada entre homens e mulheres, o presidente Alberto Fernández impôs uma quarentena rigorosa, “obrigatória e preventiva”, em todo o território nacional. Ao mesmo tempo, o Ministério das Mulheres, Gêneros e Diversidade pediu para que a identidade e o nome social da população trans fossem respeitados pelos serviços assistenciais.

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No vídeo publicado pela Organizacion por los Derechos Humanos de las Personas Trans, entretanto, é possível ver um policial se recusando a tratar uma mulher trans pelo feminino, desrespeitando a Lei de Identidade de Gênero aprovada pelo Ministério e repetindo: “É ele. O médico chama assim, então é ele“.

Em Honduras, a ativista trans Gabriela Redondo, diretora do Coletivo Unidad Color Rosa, foi detida por policiais quando estava a caminho do supermercado. Ele alegaram que ela havia desrespeitado o toque de recolher imposto no país, mas ela afirma que a detenção foi arbitrária e motivada por preconceito.

“Eles zombaram do nome de Gabriela, me chamaram com o nome do documento de identidade. A Associação treinou forças policiais sobre os direitos da população trans de Honduras. Eles me fizeram sofrer muita dor, muita vergonha, muita humilhação e muita discriminação apenas para estragar nossas vidas”, declarou à Agência Presents.

A ativista hondurenha Gabriela Redondo (Foto: Arquivo pessoal)
A ativista hondurenha Gabriela Redondo (Foto: Arquivo pessoal)

A prisão de Gabriela, que foi conduzida à delegacia e não teve direito a um advogado, não parece ser um caso isolado. Outras ONGs e associações de luta pelos direitos humanos das pessoas LGBTQ já avisaram que receberam denúncias parecidas nos últimos dias e pediram que o país aprove uma Lei de Identidade de Gênero que garanta a segurança da população trans.

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Desde que os primeiros casos surgiram, foi entregue uma carta à Corte Interamericana de Direitos humanos (CIDH) com denúncias das violações de tratados internacionais sobre os direitos das pessoas trans. Até o momento, a Corte não se manifestou.