Nesta edição da História Queer, relembramos o legado de Carlos Jáuregui, um dos principais ativistas pelos direitos LGBTI+ durante a década de 1980 e começo dos anos 90, na Argentina. Sua vida, mesmo que tenha terminado breve, deixou um marco inspirador no movimento argentino e latinoamericano, impulsionando o reconhecimento e a visibilidade para a diversidade que perdura até hoje.

Nascido em 1957, na cidade de La Plata, Carlos faleceu ainda jovem, aos 38 anos, por complicações da Aids. Ainda assim, sua morte não foi exatamente inesperada e ele teve tempo de travar as lutas em que acreditava. Para ele, a forma mais efetiva de educar as pessoas era mudando a imagem pública que elas tinham sobre pessoas LGBTI+ e, portanto, foi o que ele fez: ao invés de viver em segredo e fora dos holofotes, ele tomou controle da narrativa, indo em todas as revistas que podia e dando seu rosto para um movimento que havia permanecido nas sombras por muito tempo.

Carlos Jáuregui: professor de história foi o criador da primeira Parada do Orgulho de Buenos Aires e o responsável pela primeira lei contra LGBTfobia na América Latina (Foto: Reprodução)
Carlos Jáuregui: professor de história foi o criador da primeira Parada do Orgulho de Buenos Aires e o responsável pela primeira lei contra LGBTfobia na América Latina (Foto: Reprodução)

A inclinação de Carlos para o ativismo nasceu durantes os anos 1980 na França, enquanto cursava sua pós-graduação em História Medieval na École Pratique des Hautes Études. Foi nesse período que ele viu pela primeira vez a Parada do Orgulho de Paris, experiência que descreveu como “o motor de sua militância”.

“A partir desse momento, comecei a pensar que devia fazer algo na Argentina. Na França, tive o gosto de como era possível viver em uma sociedade livre”, declarou. “Chorei como nunca quando vi minha primeira marcha. Tive a certeza de que havia descoberto algo que queria realmente fazer.”

Carlos Jáuregui durante a 2ª Marcha do Orgulho Gay e Lésbico de Buenos Aires, em 28 de junho de 1993 (Foto: Reprodução)
Carlos Jáuregui durante a 2ª Marcha do Orgulho Gay e Lésbico de Buenos Aires, em 28 de junho de 1993 (Foto: Reprodução)

 

Em 1984, Carlos fundou e presidiu a Comunidad Homosexual Argentina (CHA), onde permaneceu por três anos. No início da década seguinte, ele então trocaria o posto para criar a organização Gays por los Derechos Civiles e organizar a primeira Parada do Orgulho em Buenos Aires, em 1992. Sua posição à frente do movimento fez com que ele se tornasse um dos primeiros líderes mundiais na batalha pelos direitos da comunidade LGBTI+ no País, e ele aproveitou a notoriedade para impulsionar a luta usando sua própria figura como exemplo.

Na época de sua presidência na CHA, não existiam leis que impediam a discriminação contra pessoas LGBTIs na Argentina e o apoio público de líderes religiosos e conservadores ao ódio contra pessoas da comunidade era abertamente disseminado. Em determinado momento, Carlos inclusive processou por discriminação o arcebispo de Buenos Aires, Antonio Quarracino, quando este declarou que homossexuais deveriam ficar “trancados em um gueto” por serem “uma mancha suja na nação”.

Carlos Jauregui dando entrevista à TV argentina durante Marcha do Orgulho organizada por ele nos anos 1990 (Foto: Reprodução)
Carlos Jauregui dando entrevista à TV argentina durante Marcha do Orgulho organizada por ele nos anos 1990 (Foto: Reprodução)

Após perder o processo porque a discriminação contra pessoas LGBTI+ ainda não era criminalizada na Argentina, Carlos Jáuregui impulsionou pouco antes de morrer a criação de uma lei que finalmente incluía o preconceito contra orientação sexual na Constituição da Cidade de Buenos Aires.

Uma semana após sua morte, ativistas LGBTIs marcharam segurando fotos de Carlos, demandando que a medida fosse incorporada à legislação municipal, o que provocou sua aprovação por unanimidade apenas dias depois. Com isso, a capital argentina se tornou a primeira cidade latino-americana a proibir atos discriminatórios direcionados à orientação sexual.

Em 1998, Carlos foi condecorado postumamente com o Prêmio Felipa de Souza, uma dos principais honrarias internacionais dedicadas à defesa dos Direitos humanos. Em 2017, uma estação de metrô em Buenos Aires também foi rebatizada em sua homenagem, ganhando seu nome e um mural com fotos suas. 

Estação me Quedo Santa Fé-Jáuregui, nomeada em homenagem ao ativista argentino LGBTI+ (Foto: Reprodução)
Estação me Quedo Santa Fé-Jáuregui, nomeada em homenagem ao ativista argentino LGBTI+ (Foto: Reprodução)

Para um homem que viveu uma vida tão curta, há ainda muito de seu legado hoje. A memória de Carlos Jáuregui pode continuar sendo uma inspiração para os nossos ativistas na luta pela asseguração dos direitos humanos de pessoas LGBTI+. As palavras de Carlos que acompanham seu mural em Buenos Aires ajudam a expressar esse pensamento:

“Numa sociedade que nos ensina a ter vergonha, o orgulho é uma resposta política”


Este texto foi adaptado do original de Laura Darling e faz parte do projeto Making Queer History, cuja existência só é possível graças a doações. Se tiver interesse, você pode fazer uma doação única no Paypal ou tornar-se um Patrono.