Ao lado de grandes nomes do cenário artístico nacional, Liniker, aos 28 anos, foi uma das personalidades eleitas imortais pela Academia Brasileira de Cultura (ABC), tornando-se simultaneamente a primeira pessoa transexual a receber esta honraria. Emocionada, ela chorou enquanto era ovacionada durante a cerimônia de entrega realizada na noite da terça-feira (14), no Rio de Janeiro.

“Eu sou muito grata pela voz que eu tenho estudado, pela voz que eu tenho preenchido dentro de mim para poder existir, para poder permanecer em pé. Porque estar em pé no Brasil sendo uma travesti preta é muito difícil”, disse a artista já emocionada durante o seu discurso de aceitação da homenagem. “Ser a primeira vez que uma travesti é empossada na Academia Brasileira de Cultura é muito importante e é fundamental para a cultura do nosso país, que abre esse mapa de diversidade, esse mapa de excelência – porque sim, somos excelentes. E esse empossamento, essa cadeira, ele não pode ser só meu.”

Liniker foi eleita para a cadeira 51, cuja patrona é Elza Soares. As duas já cantaram juntas algumas vezes ao longo de suas carreiras e chegaram a gravar o dueto “Foi Você, Fui Eu”, usado como tema da série Carcereiros (2017), do Globoplay. “Na noite de hoje, com toda essa emoção, eu estou muito feliz não só por esse lugar, mas também feliz por ter Elza Soares como patrona, essa grande voz, esse grande acontecimento, considerada a voz do milênio. Eu fico muito feliz de ter uma voz e poder cantar pra tantas pessoas que também se sentem representadas pelo meu canto e que seguirão me ouvindo independente de eu seguir aqui ou não.”

“Esse fato é histórico, mas não pode ser passado. Esse fato precisa ser atualizado constantemente. Que a cada empossamento, a cada nova pessoa imortal, a cada acadêmico que entre, também sejam pesadas pessoas pretas, pessoas LGBTQIA+ do Brasil, pessoas que, sim, movimentam a cultura, renda, intelectualidade, afeto e várias coisas que não são nem ditas porque elas só são sentidas”, disse.


Nas redes sociais, ela voltou a se emocionar pela homenagem: “Eu ainda nem sei o que falar com tamanha honraria que recebo. Nunca achei que seria possível ser considerada assim, por não imaginar mesmo, por ser distante. No meu peito se encontra um certo silêncio preenchido por emoção, por imaginar minha trajetória até aqui, pensando em tudo o que eu já escrevi e ainda escreverei, cantarei, interpretarei, assimilarei e construirei junto à cultura brasileira”.

“Isso não é apenas um post numa rede social. Aqui vemos a história sendo escrita junto a um mar de novas possibilidades que se abrem para tantas pessoas no Brasil. Nós estamos aqui e nós existimos”, escreveu.

Além de Liniker, a ABC também elegeu como imortais outras dez mulheres notáveis do Brasil na noite desta terça. São elas as cantoras Daniela Mercury, Alcione e Margareth Menezes, atual ministra da Cultura; as atrizes Glória Pires, Vanessa Giácomo, Beth Goulart e Luana Xavier; a ativista e Ministra dos Povos Originários Sônia Guajajara; a ambientalista Juma Xipaia; e a escritora Conceição Evaristo.

Daniela Mercury e Liniker durante cerimônia na Academia Brasileira de Cultura (Foto: Reprodução Instagram)
Daniela Mercury e Liniker durante cerimônia na Academia Brasileira de Cultura (Foto: Reprodução Instagram)

“A arte é a nossa mais poderosa forma de expressão e comunicação e é com ela que afirmo nosso direito à felicidade. Venho ao longo dos meus 40 anos de carreira exaltando a minha gente brasileira”, disse Daniela durante o evento. “Muitos grandes artistas renovam e reforçam diariamente minha fé em nós. São eles que nos humanizam com suas músicas, livros, obras visuais, pinturas, desenhos, esculturas, coreografias e tantas formas de arte aqui representadas hoje!”