O que pode dar errado quando você começa a futucar o passado e os segredos da sua família? Essa premissa tem atiçado o cinema há décadas e voltou nos últimos anos à mente de alguns diretores, um deles João Cândido Zacharias, que lançou no Festival do Rio o terror nacional A Herança, seu primeiro longa-metragem.

A história começa quando Thomas (Diego Montez) descobre que sua mãe, que não vê há uns dez anos, morreu repentinamente e deixou uma casa desconhecida de herança. Precisando de dinheiro e com o visto na Alemanha prestes a expirar, ele decide arrastar o namorado Beni (Yohan Levy) até o interior do Brasil para ver a propriedade e quanto dinheiro conseguiria com a sua venda.

Ao chegarem, eles descobrem que Thomas possui não apenas uma casa desconhecida, mas também duas tias, Vitória e Hilda (Analu Prestes e Gilda Nomacce), das quais nunca ouviu falar. Em pouco tempo, elas relembram memórias do passado, incluindo a repentina fuga da mãe do jovem, quando ele ainda era um bebê. Já pelo título e pela premissa apresentada nos primeiros 15 minutos de filme, é possível deduzir corretamente que a história mistura uma série de elementos nada inéditos ao terror: rituais ancestrais, uma casa mal assombrada, uma herança maldita, bruxas da Europa Oriental, profecias de reencarnação etc.

Diego Montez e Yohan Levy em cena de "A Herança" (Foto: Divulgação)
Screenshot

O fato de ser protagonizado por um casal gay não chega a fazer muita diferença em “A Herança”, exceto nos momentos em que explora especificamente a relação entre eles – algo secundário à história principal. “É engraçado você ter uma personagem queer onde isso não é o tema. ‘Nossa, meu Deus, ele é gay’. Não, por acaso esse personagem é queer. O filme não é sobre estas questões”, disse Montez à Híbrida.

A produtora Tatiana Leite, da Bubbles Project, explica que a escolha de usar um casal gay para protagonizar a história veio de forma natural e consciente. “É algo que totalmente faz parte do nosso cotidiano e, de fato, não existe dentro do gênero um protagonismo gay, então a gente fez questão de trazer isso. Sempre tem aquele casalzinho hétero clássico, a menina com medo. A gente quis inverter isso um pouquinho, né?!.”

Em um comunicado enviado à imprensa, Zacharias também disse que a experiência de lidar com os “monstros escondidos” da própria família foi “essencial para a criação dessa história”. O roteiro, que ele divide com Fernando Toste, mistura uma penca de referências, como Suspiria, Hereditário, Twin Peaks, Burnt Offerings e muitos outros, que são facilmente identificáveis, em maior ou menor grau.

A Herança tenta se equilibrar entre o terror e o drama, com momentos engraçados e alguns furos no roteiro que acabam confundindo o espectador. Por fim, ele termina deixando no ar se havia também a intenção de se aventurar pelo trash, sem surpreender muito os fãs do terror, mas marcando seu espaço em um território narrativo ainda pouco explorado no Brasil.

Cartaz de "A Herança"
Cartaz de “A Herança”

A Herança tem co-produção da Sony Pictures International Productions e faz parte da mostra Midnight Movies, do Festival do Rio. Confira aqui as sessões e disponibilidade de ingressos.