O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), voltou a se opor à inclusão de temas sobre a diversidade sexual e de gênero nos livros didáticos do Estado. Durante sua participação no programa “Roda Viva”, da TV Cultura, na última segunda-feira (23), ele defendeu o mesmo posicionamento de 2019, quando mandou recolher livros de ciência do 8º ano do ensino fundamental por fazer suposta “apologia” à “ideologia de gênero”.

Segundo Doria, questões LGBTI+ “podem ser discutidas”, mas não “impostas” nos materiais escolares. “A questão aí não era sobre discussão, era imposição de um livro didático contendo apologia a este tema. E a recomendação foi do secretário de Educação, Rossieli Soares, e nós seguimos. E não tem nenhum arrependimento sobre isso. Discutir é uma coisa, impor didaticamente um tema é outra coisa”, declarou.

Questionado sobre o termo “ideologia de gênero”, usado por ele no vídeo de 2019, já refutado por especialistas e geralmente associado a ideais da extrema-direita, ele se desvencilhou e respondeu: “Existe identidade de gênero. Mas você não pode impor isso a uma criança que frequenta uma escola. Você pode debater esse tema, mas impor a ela com material didático, não. Nisso não houve nenhum arrependimento.”

Perguntado pela jornalista Vera Magalhães se não seria necessário ter livros didáticos para a discussão, ele rebateu: “A questão não é debater e discutir. É um material didático, impresso, distribuído como referência do sistema de educação do Estado de São Paulo. A opção do secretário foi correta e foi mantida por mim”. Assista abaixo:

A ordem de Doria para recolher as apostilas em questão foi avisada por suas redes sociais em setembro de 2019, poucos dias antes de o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), ter censurado uma HQ com beijo gay na Bienal do Livro. O governador de São Paulo teria reagido a uma provocação do presidente Jair Bolsonaro, que atacou o mesmo material, dizendo que iria recorrer ao Ministério da Educação para preparar um projeto de lei que proibiísse a “ideologia de gênero” nas escolas.

O livro em questão, voltado para alunos de 13 a 14 anos cursando o 8º ano do ensino fundamental, trazia ilustrações de como usar preservativos masculinos e femininos como forma de proteção a doenças e infecções sexualmente transmissíveis, assim como a gravidez precoce. Em outra seção, apresentava conceitos sobre orientação sexual e identidade de gênero, definindo termos como “transgênero” e “cisgênero”, e afirmando que “ninguém ‘nasce homem ou mulher’, mas nos tornamos o que somos ao longo da vida”.

Livro de ciências voltado ao 8º ano do ensino fundamental ensinava o uso correto de preservativos masculinos e femininos para a prevenção de DSTs e ISTs (Foto: Reprodução)
Livro de ciências voltado ao 8º ano do ensino fundamental ensinava o uso correto de preservativos masculinos e femininos para a prevenção de DSTs e ISTs (Foto: Reprodução)
Outra seção do livro de ciência definia conceitos relativos à orientação sexual e identidade de gênero (Foto: Reprodução)
Outra seção do livro de ciência definia conceitos relativos à orientação sexual e identidade de gênero (Foto: Reprodução)

Apesar de classificar o material como “apologia” ou “imposição”, a discussão da diversidade sexual e de gênero nas escolas já é uma realidade de outros países e do próprio Brasil. A Inglaterra aprovou, ainda no ano passado, a inclusão obrigatória de temas LGBTI+ em todas as fases da vida escolar, como uma forma de “apoiar todos os jovens a serem felizes, saudáveis e seguros” e ajudar os jovens a “entenderem a sexualidade humana, se respeitarem e respeitarem outros”, assim como “aprenderem a importância da igualdade”.

Em maio, o Rio de Janeiro também aprovou a lei estadual “Escola Sem Mordaça”, que “prevê a liberdade de expressão dos professores, estudantes e funcionários em ambientes escolares” para “garantir o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas nas escolas” e o “debate de temáticas como as de gênero e diversidade”.