Após intensas discussões e controvérsias, a Austrália decidiu incluir, pela primeira vez, uma pergunta referente à orientação sexual no seu Censo 2026. A decisão foi anunciada após uma série de críticas de organizações LGBTQIA+ ao governo australiano, que havia se recusado a abordar questões relacionadas à comunidade na pesquisa demográfica.

O debate teve início no último dia 25, quando o ministro adjunto das Finanças Andrew Leigh comunicou à imprensa que perguntas sobre orientação sexual e identidade de gênero não seriam incluídas no próximo Censo, seguindo os moldes do que ocorrera em 2021.

Richard Males, vice-primeiro-ministro, endossou a decisão, alegando que as questões iriam levantar discussões divisivas dentro da sociedade: “Vimos como debates divisivos se desenrolaram em todo o nosso país, e a última coisa que queremos fazer é impor esse debate a um setor de nossa comunidade agora. E é por isso que estamos levando, em termos gerais, o conjunto de perguntas do último censo para o próximo”.

Com a recusa, diversas organizações que lutam em prol dos direitos humanos do país se uniram para criticar a medida.

“O governo federal traiu as pessoas LGBTIQA+ em toda a Austrália, que novamente serão tornadas invisíveis em 2026, porque o censo não fará perguntas apropriadas sobre quem são e como vivem”, afirmou a ativista Anna Brown ao portal PinkNews.

Diante da reação negativa, o governo australiano anunciou no último dia 30 que incluirá pela primeira vez no Censo uma questão relativa à orientação sexual da população.

“Temos conversado com o Australian Bureau of Statistics (ABS), e eles vão testar uma nova pergunta, uma pergunta sobre sexualidade, preferência sexual. Eles vão testar, garantindo que as pessoas terão a opção de não responder (“prefiro não responder”). Achamos que essa é uma posição sensata a ser adotada”, revelou o primeiro-ministro Anthony Albanese.

Ao público, Albanese comentou que a decisão não representa uma “mudança de posição”, uma vez que até aquele momento ele não havia sido questionado sobre o assunto: “Esta é a primeira vez que me perguntam sobre isso. O Censo não sofrerá uma mudança total e radical, pois acreditamos que tem sido eficaz no passado. Por muitas questões, o Censo não é o veículo mais apropriado para engajar com a comunidade”, explicou.

Apesar do avanço, grupos LGBTQIA+ ainda seguem lutando para que o Censo tenha no futuro questões ainda mais inclusivas referentes às identidades e direitos de pessoas trans e não-bináries.

“Não está claro quais são os planos do governo em relação às perguntas sobre pessoas trans e intersexuais, mas o que sabemos é que esses dados são vitais para que o governo tome decisões sobre programas e financiamentos, garantindo que esteja governando para todos os australianos”, comentou Brown.

Brasil na contramão da Austrália

A dificuldade em obter informações precisas sobre a realidade da população LGBTQIA+ não é exclusiva da Austrália. No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), responsável pelo Censo demográfico, já reconheceu que a pesquisa não abrange adequadamente toda a comunidade.

Na edição de 2022, dados sobre a vivência de pessoas LGBTQIA+ brasileiras não foram coletados, após uma série de disputas públicas sobre o tema. A orientação sexual da população só veio a aparecer na Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do mesmo ano, mas ainda em “caráter experimental”.

Em 2023, o instituto começou a aplicar uma versão da Pesquisa Nacional de Saúde, que pretende incluir informações sobre a orientação sexual e identidade de gênero dos brasileiros, de maneira inédita e conjunta. A previsão é que os resultados começem a ser divulgados no último trimestre deste ano.

Organizações da sociedade civil, como a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), o Grupo Gay Bahia (GGB), o Grupo Arco-Íris, dentre outros, seguem se manifestando sobre a necessidade de uma pesquisa que englobe questões relacionadas às vivências e sujeitos LGBTQIA+ no país.