Na última sexta-feira (21), a cidade de Pádua, no norte da Itália, começou a remover o nome de mães LGBTQIA+ não-biológicas das certidões de nascimento de seus filhos, graças a uma nova legislação recém-aprovada pelo governo da primeira-ministra Giorgia Meloni. De acordo com a Promotoria local, pelo menos 33 crianças de 27 famílias italianas já foram afetadas pela nova medida.

A lei estabelece que crianças geradas por inseminação artificial deverão ter reconhecidas somente a filiação da pessoa que gestou o feto. Na Itália, a prática da barriga de aluguel é considerada ilegal e o casamento LGBTQIA+ ainda não é legalizado em território nacional. A adoção por pais ou mães não-biológicos só é permitida por decisão judicial.

Em março deste ano, o governo de Meloni apresentou o projeto de lei cujo objetivo é proibir nacionalmente famílias que recorram à inseminação fora do país – prática comum entre casais LGBTQIA+ italianos que desejam ter filhos-, sob a pena de multa superior a U$S 1 milhão (R$ 4,75 milhões aproximadamente) ou até prisão de dois anos.

As mães prejudicadas até o momento tinham gerado seus filhos em outro país e conseguido registrá-los na Itália graças a uma lei municipal de Pádua, onde o prefeito de centro-esquerda Sergio Giordani tem levantado essa bandeira desde que foi eleito em 2017. Durante a campanha, ele prometeu inclusive remover as designações “mãe” e “pai” das certidões de nascimento.

No entanto, desde que Meloni (do partido de extrema-direita Irmãos de Itália) venceu as eleições e se tornou a primeira-ministra em outubro de 2022, os direitos de pessoas LGBTQIA+ têm sido cada vez mais ameaçados no país.

Durante sua campanha, a premiê chegou a afirmar que, caso vencesse, não iria atuar a favor de políticas inclusivas. “Sim à família natural, não ao ‘lobby LGBT’; sim à identidade sexual, não à ideologia de gênero”, declarou à época, em encontro com o partido de ultradireita Vox, da Espanha.

A primeira-ministra italiana Giorgia Meloni [Foto: Gianni Pasquini / Alamy Stock Photo]
A primeira-ministra italiana Giorgia Meloni [Foto: Gianni Pasquini / Alamy Stock Photo]

De acordo com grupos de defesa dos direitos humanos, o cancelamento das certidões em Pádua pode incentivar outros governos locais na Itália, controlados pela centro-direita e direita, a adotarem a mesma medida, que ainda não foi aprovada pelo Parlamento.

“Essas certidões de nascimento não infringiram nenhuma lei, já que foram assinadas em um vácuo legislativo, que agora deixa nossas crianças no limbo. Nós pedimos que nossas crianças sejam cidadãs, plenamente protegidas, e que nossas famílias não sejam destruídas pela vontade política do governo de impor um modelo de família única”, afirmou o grupo Rainbow Family Association, em nota de repúdio.

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A Itália é o país com um dos piores índices de violência contra a população LGBTQIA+ na Europa Ocidental. Seu histórico de opressão é datado desde a Segunda Guerra Mundial, quando Benito Mussolini, baseado na tentativa de “purificação viril” do regime fascista, exilou homens gays na Ilha de San Domino, sentenciados à prisão domiciliar.

Meloni, inclusive, já chegou a declarar que Mussolini “foi um bom político” quando tinha 19 anos. Durante sua ascensão ao cargo de primeira-ministra, porém, tentou desvincular seus laços com o ditador, alegando que em seu partido não havia espaço para os nostálgicos do fascismo.

Apesar disso, o uso de uma retórica homotransfóbica e anti-imigração, ancoradas sob o lema “Deus, pátria e família”, seguem sendo endossadas pela primeira-ministra e pelos demais políticos alinhados ao seu espectro ideológico.