O deputado federal David Miranda anunciou no último sábado (22) sua saída oficial do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e a sua afiliação ao Partido Democrático Trabalhista (PDT). Segundo ele, o movimento será oficializado em março e veio da percepção de que o PSOL estaria correndo o risco “de sacrificar a sua essência para se tornar um braço leal de um partido e ideologia a que foi criado para se opor”, explicou, referindo-se ao provável apoio da legenda ao Partido dos Trabalhadores (PT) nas eleições de 2022.

“A minha saída do PSOL (…) não significa uma ruptura com os atuais companheiros de luta – que continuo considerando aliados -, nem um afastamento dos valores que me levaram ao partido anos atrás. (…) Nenhum partido político é perfeito, mas o PSOL, a meu ver, corre o risco neste momento de sacrificar a sua essência para se tornar um braço leal de um partido e ideologia a que foi criado para se opor”, escreveu o deputado, em carta aberta.

A troca foi anunciada na mesma data em que Leonel Brizola (1922-2004), fundador do PDT, completaria 100 anos. Miranda frisou que não concorda com todas as votações recentes da legenda no Congresso, mas disse reconhecer no novo partido “diversos valores históricos e atuais fundamentais para a reconstrução do Brasil, em especial os ideais trabalhistas e o legado” de Brizola.

“Discordar não é atacar. A esquerda precisa aprender a expressar discordância, criticar ideias e debater projetos políticos sem desrespeito, ofensa e ódio à indivíduos”, publicou Miranda em suas redes sociais, logo após anunciar também seu apoio à candidatura de Ciro Gomes (PDT) à presidência.

David começou sua carreira política no PSOL em 2016, quando se elegeu vereador da capital fluminense. Dois anos depois, ele assumiu a cadeira de deputado federal pelo Estado do Rio, após Jean Wyllys ter sido reeleito ao cargo e renunciado ao mandato por medo das ameaças que recebia dos apoiadores do então recém-eleito presidente Jair Bolsonaro (PL). Os dois deputados protoganizaram inúmeros embates no Congresso, culminando no episódio em que Wyllys cuspiu na cara de Bolsonaro durante a votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Nos anos que se seguiram, Wyllys sempre sustentou que a cusparada veio como forma de indignação após Bolsonaro ter dedicado seu voto pelo impeachmente a Carlos Alberto Brilhante Ustra, ex-chefe do DOI-CODI e torturador de Dilma na ditadura militar. “Aquilo foi tão indigno, eu tremia de ódio e raiva. Quando fui votar em sequência [de Bolsonaro], fui em uma chuva de insultos. Quando voltei ao meu lugar, esse sujeito [Bolsonaro] fez um insulto homofóbico, que não vou reproduzir, e aí nessa hora entrei em um transe e cuspi”, disse em entrevista recente ao UOL.

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Depois de ser reeleito a deputado federal no mesmo pleito que deu a presidência a Jair Bolsonaro, Wyllys abandonou o Brasil e foi viver na Espanha. Desde então, seu mandato foi assumido por David Miranda, que recebeu 17.356 votos em 2018 e era o primeiro suplente do PSOL ao cargo. Carioca e cria do Jacarezinho, ele é abertamente gay e casado com o também jornalista Glenn Greenwald, com quem tem dois filhos. Uma de suas principais bandeiras é a defesa dos direitos humanos, em especial da comunidade LGBTI+.

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A saída de David é a segunda baixa que o PSOL sofre em seu quadro nacional de representantes da comunidade LGBTI+ nos últimos meses. Em maio do ano passado, Jean Wyllys também anunciou que estava saindo do partido para filiar-se ao PT, em apoio à candidatura do ex-presidente Lula nas próximas eleições.

“Quero liberdade plena para fazer desde já o que eu acho certo e melhor para o País”, declarou Wyllys em entrevista ao Estadão. “Tenho confiança que os melhores quadros do PSOL vão conseguir, mas eu não tenho vontade de participar dessa luta interna, que é muito desgastante. E também não queria constranger ninguém do partido com a minha posição pública, que seria apoiar o Lula sem demora.”

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O PSOL tem sofrido uma divisão interna entre quem defende um nome próprio da legenda para disputar a presidência nas eleições de 2022 e aqueles que são a favor de apoiar a campanha de Lula ao cargo. Apesar de sua candidatura ainda não ter sido oficialmente anunciada, espera-se que Jean Wyllys dispute este ano uma nova vaga à Câmara dos Deputados, desta vez pelo PT.

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Já o PDT tem sido alvo de críticas da comunidade LGBTI+ desde que oito deputados do partido votaram contra a inclusão de travestis e transexuais no Projeto de Lei 349/15, de combate à violência política contra mulheres. A recusa dos parlamentares da legenda foi duramente criticada por Duda Salabert, que se elegeu pelo PDT como a vereadora mais votada de Belo Horizonte nas eleições de 2020.

“Na semana em que sou ameaçada de morte, alguns parlamentares do PDT votam contra incluir mulheres trans no projeto que combate violência política contra mulheres. Votaram assim no Dia Internacional dos Direitos humanos. Covardes! Desumanos! Canalhas! Transfóbicos! Traidores!”, escreveu Duda.

Leia aqui a carta aberta publicada por David Miranda sobre sua saída do PSOL.