A Polícia Federal prendeu no início deste domingo (24) três homens responsáveis pelo assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, em 14 de março de 2018. Outros 12 mandatos de busca e apreensão foram expedidos.

A Operação Murder Inc. foi realizada em conjunto com o Ministério Público do Rio de Janeiro e a Procuradoria Geral da República e teve como alvo Chiquinho Brazão, deputado federal pelo União Brasil; seu irmão Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro; e Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil do Rio.

Os três foram apontados como os mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, além da tentativa de homicídio de Fernanda Chaves, assessora da vereadora. A operação também cumpriu nesta manhã outros 12 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Na última terça-feira (19), o ministro da Justiça e Segurança Pública Ricardo Lewandowski anunciou que o ex-policial militar Ronnie Lessa, responsável pela execução de Marielle e Anderson, fechou um acordo de delação premiada, já homologado pelo STF. O caso está sendo conduzido na Corte pelo ministro Alexandre de Moraes.

Família de Marielle Franco se pronuncia

Irmã de Marielle, a ministra de Igualdade Racial Anielle Franco falou sobre a operação que prendeu os irmãos Brazão e agradeceu o empenho da Procuradoria Geral da República, do Ministério Público do Rio de Janeiro e da Polícia Federal para a elucidação do caso.

“É um dia histórico para a democracia brasileira e um passo importante na busca por justiça no caso de Marielle e Anderson”, disse Anielle. “Todas as prisões são preventivas e ainda há muita coisa a ser investigada e elucidada, principalmente sobre o esclarecimento das motivações de um crime tão cruel como esse.”

A prisão que mais surpreendeu o público e a própria família de Marielle Franco foi a de Rivaldo Barbosa, que era o chefe da Polícia Civil na época do crime. Ele quem recebeu as viúvas de Marille e Anderson, Mônica Benício e Agatha Arnaus. Rivaldo assumiu o cargo apenas um dia antes da morte de Marielle, em uma nomeação assinada pelo então interventor na Segurança Pública do Rio de Janeiro, o general Walter Barga Netto, que depois se tornou ministro do governo de Jair Bolsonaro.

“O anúncio do seu nome mostra que a Polícia Civil não foi apenas falha, mas cúmplice deste crime”, comentou Mônica, que desde 2021 é vereadora da cidade do Rio. “Rivaldo, que recebeu as nossas famílias logo após Marielle e Anderson serem assassinados, com o sorriso cínico que só as mais corruptas das burocracias podem produzir, nos dizendo que o caso seria uma prioridade máxima para ser solucionado o mais rápido possível.”

A vereadora Mônica Benício fala à imprensa na porta da sede da Polícia Federal, no Rio de Janeiro, sobre desdobramentos da investigação do assassinato de Marielle Franco (Foto: Tomaz Silva | Agência Brasil)
A vereadora Mônica Benício fala à imprensa na porta da sede da Polícia Federal, no Rio de Janeiro, sobre desdobramentos da investigação do assassinato de Marielle Franco (Foto: Tomaz Silva | Agência Brasil)

Com a prisão de Rivaldo, o estado do Rio de Janeiro já teve 4 ex-chefes de polícia civil presos desde 2008: Álvaro Lins, Ricardo Hallak e Allan Turnowski. Além disso, os fluminenses também viram 5 ex-governadores pararem atrás das grades: Moreira Franco, Rosinha e Anthony Garotinho, Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão.

Já os irmãos Brazão são rostos conhecidos da política carioca há décadas. O reduto da família é Jacarepaguá, na Zona Oeste, área dominada por milicianos. Chiquinho Brazão foi vereador durante 13 anos, entre 2005 e 2018. Nos últimos dois anos, foi colega de Marielle na Câmara de Vereadores. Foi eleito deputado federal em 2018 e reeleito em 2022, quando participou de carreatas e fez campanha a favor de Jair Bolsonaro.

Por sua vez, o irmão mais novo Domingos fez sua própria carreira política ao se eleger vereador em 1996. Dois anos depois, conseguiu pela primeira vez uma cadeira como deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), e se reelegeu para o cargo outras quatro vez. Em 2010, chegou a ter o mandato cassado por compra de votos, mas conseguiu retornar graças a uma liminar do STF.

Marielle Franco em debate sobre políticas LGBTQIA+ promovido pela UFRJ (Foto: Ricardo Schmidt | Híbrida)
Marielle Franco em debate sobre políticas LGBTQIA+ promovido pela UFRJ (Foto: Ricardo Schmidt | Híbrida)

Desde 2015, Domingos Brazão é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ). Em 2017, chegou a ser afastado de suas funções, após ser alvo da Operação Quinta do Ouro, um desdobramento da Lava Jato, mas foi reconduzido ao cargo no ano passado.

Para Marcelo Freixo, amigo de Marielle e atualmente presidente da Embratur, a família Brazão é uma amostra de como as milícias não funcionam apenas como um poder paralelo no Rio de Janeiro, mas são parte da própria estrutura governamental.

“O esclarecimento do assassinato de Marielle não diz apenas ao Caso Marielle, mas ao Rio de Janeiro”, afirma Freixo, que há 16 anos presidiu a CPI das Milícias na Alerj. “Diz respeito a ideia de que crime, política e polícia não se separam no Rio. A esse projeto em que matar é forma de fazer política. A operação da Polícia Federal hoje irá nos ajudar a entender o tamanho do buraco que está o RJ.”

(Colaborou Lívia Muniz)